Há
quase quatro anos que o Brasil se arrasta sob a atmosfera pestilenta do ódio
político. Na verdade, a coisa começou a efervescer nas jornadas de junho de
2013, quando desassombrados simpatizantes dos arranjos autoritários foram às
ruas com uma agenda que, até aquele momento, parecia ter sido enterrada com a
ditadura militar.
Na
campanha eleitoral de 2014 o ódio regurgitou, estabelecendo uma cisão de
classes que ganhou, inclusive, um enganoso recorte geográfico: de um lado, o
moderno e progressista eixo Sul/Sudeste e, do outro, o Norte/Nordeste com suas
mazelas e sua gente atrasada, votando no petê.
Dilma
Rousseff (PT) prevaleceu nas urnas – reelegeu-se no segundo turno – mas não
experimentou, sequer, uma semana de trégua: recontagem de votos, crime de
responsabilidade, abuso de poder econômico e, finalmente, impeachment tornaram-se expressões comuns no noticiário político
logo na semana seguinte às eleições.
A
catástrofe econômica que se seguiu – a maior recessão das últimas décadas no
País – quase leva a nau brasileira a adernar. E serviu para ampliar a
instabilidade política, levando muitos oportunistas a apostar no caos e,
logicamente, na derrocada da gestão petista. O fim é conhecido: o intenso
arranca-rabo descambou no impeachment
em 2016, com cenas célebres de corruptos notórios celebrando a vitória
hipócrita contra a corrupção.
Desde
então, porém, as animosidades não arrefeceram. Pelo contrário: permaneceram
ativas nas redes sociais, notórias incubadoras da discórdia, da cisão e do
ódio. Aqui ou ali avultavam, em episódios esparsos, mas todos se resguardavam
para a maior batalha vindoura no curto prazo: as eleições de 2018.
Eleições 2018
Pode-se
concluir que as eleições de 2018 começaram ano passado, quando Lula –
ex-presidente e líder na corrida sucessória até aqui – foi condenado no
controverso episódio do triplex. A confirmação de sua condenação em segunda
instância – o que, supostamente, inviabiliza sua permanência nas eleições presidenciais
–, a negação do pedido de habeas corpus pelo Supremo Tribunal Federal e, por
fim, a prisão, integram o enredo que o alija do processo eleitoral.
Lula,
a propósito, é um dos principais protagonistas – se não o principal – desses
tempos de exacerbadas emoções à flor da pele. Para os acólitos do petê e
partidos satélites, Lula é uma espécie de divindade, uma figura mítica,
messiânica; para seus detratores – sobretudo a linha-dura que aflorou a partir
do mencionadas manifestações de 2013 – trata-se da encarnação do Mal; uma
figura pérfida, capaz das mais abjetas torpezas.
Sociedades
movidas por dicotomias tão radicais tendem à fissura, à desagregação. Essas
visões dicotômicas, binárias, inclusive, não se aplicam apenas à leitura sobre
Lula: aplicam-se às demais esferas da vida política e até sobre a economia,
como se os processos dessa última fossem movidos pela passionalidade das
gincanas.
Isoladas,
as opiniões do “homem da rua” valiam pouco. Hoje, agrupadas nos caldeirões das
redes sociais, ganham força porque se impõem pela vacuidade e pelo apelo às
fórmulas fáceis. Daí para os entusiastas dessas receitas se agruparem em
raivosas milícias digitais é só um passo. E apenas outro para ganharem as ruas,
em intrépidas patrulhas.
Faltam
longos seis meses até as eleições e o clima no País já é de beligerância
explícita. O próprio comandante do Exército – corporação retraída até então –
deu declarações inquietantes antes do julgamento de Lula. Sinal que a
democracia vem se tornando artigo barato no Brasil nos últimos anos, depois de
tanta luta para se alcançar um patamar mínimo de civilidade.
Qual será o próximo passo
dessa derrocada? Não surpreenderia a recriação do Departamento de Ordem
Política e Social, o finado Dops.
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