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Camelôs e ambulantes alavancam “retomada” econômica

Resultados preliminares indicam que o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 1,04% em 2017. O desempenho vem sendo comemorado com empolgação pelo controverso presidente Michel Temer (MDB-SP) e por seu sisudo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD-GO), que se acotovelam na tentativa de viabilizar as próprias candidaturas à presidência da República. Fala-se em PIB crescendo perto de 4% no final do ano, depois das eleições. E garantem que a vereda da prosperidade foi aberta, com o País retomando o almejado desenvolvimento.
Quem se prende à fria rigidez dos números não consegue entender o que está se passando no Brasil. Basta circular pelas cidades do País para perceber que há muita loja fechada, muita placa de “vende-se” ou “aluga-se”, muita gente circulando à procura de emprego, com a Carteira de Trabalho num envelope ou num desses classificadores transparentes. Muitos sustentam o olhar perdido, vazio, enquanto voltam para casa de ônibus, após mais uma busca infrutífera.
Mesmo assim, os pré-candidatos seguem martelando números positivos, anunciando a prosperidade com sorrisos largos, fáceis. Ano passado, finalmente a sangria do desemprego foi estancada, com geração de algumas centenas de milhares de empregos. Mas há aí pouco mérito dos governantes: é que boa parte dos postos de trabalho foi criada no setor informal, sem registro em carteira e com a precariedade habitual.
O fenômeno é simples: interditado o acesso ao emprego formal – graças à ruinosa crise legada por Dilma Rousseff (PT) – o brasileiro começou a se virar com pode: reúne economias, faz uma guia, compra um produto qualquer e sai vendendo pelas ruas das cidades; ou abre uma microempresa e vai aventurar prestar serviço barato para quem precisa ou dispõe de alguma folga financeira.

Feira de Santana

Basta circular pelas ruas centrais da Feira de Santana para confirmar o fenômeno. Cocada, biscoito, utilidades plásticas, tranqueiras importadas da China, brinquedos, capa para celular, tudo é visível pelas calçadas feirenses. Aqui ou ali fica-se sabendo que o cidadão perdeu o emprego formal e, agora, aventura-se com uma banquinha, tentando garantir algum para comprar o pão, o café, o feijão ou pagar uma conta de água ou de luz.
Pelas ruas comerciais dos bairros feirenses o fenômeno se repete: cresceu assustadoramente o número de bancas que mercadejam acarajé, pastel, coxinha, quibe, cachorro-quente; multiplicaram-se os que acoplam vasilhames plásticos em bicicleta para vender salgados o suco em frente às poucas obras em andamento ou defronte às clínicas no centro da cidade.
Quem dispõe de carro próprio aventura-se vendendo ovo – símbolo maior da dura crise econômica –, beiju ou cuscuz de tapioca e até detergente, anunciando seus produtos com estridentes autofalantes pelos bairros populares. Alguns aguardam dias melhores dirigindo como motoristas de aplicativo ou, simplesmente, transportando passageiros clandestinamente, no popular “ligeirinho”.

Médio Prazo

A “correria” – expressão popular comum nas periferias – do brasileiro sem opções de sobrevivência foi apropriada com cínica desfaçatez pela trupe encastelada no poder. E a imprensa glamourizou o antigo bico ou biscate: virou “oportunidade de negócio”, que “empreendedores” aproveitam para garantir um trocado a mais no fim do mês. O palavrório rebuscado, porém, é incapaz de encobrir a precariedade.
O que se pode esperar no médio prazo? O mesmo cenário mesquinho. Afinal, há aí, já, leis trabalhistas sob encomenda para formalizar a precariedade; a terceirização se tornou uma política de Estado; e direitos elementares, como a aposentadoria, estão se tornando luxo injustificável, coisa de excêntrico. Entre os presidenciáveis, ninguém debate essas questões. Apresentar projeto, então nem pensar.
Dissemina-se, conforme se viu, que o pior já passou, que o País vem melhorando. É questionável: primeiro é necessário que se trace um rumo. Nos últimos quatro anos o Brasil passou a funcionar na base do improviso sem subterfúgios. Dilma Rousseff engendrou o caos e seu sucessor, Michel Temer, sem projeto, tornou o balcão um fim em si mesmo. Vemos aí os resultados. Outubro dirá se vai se continuar na mesma toada. Ou não. Sempre há espaço para piorar.

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