Pular para o conteúdo principal

Homicídios mais que dobraram em 20 anos em Feira

No dia 05 de julho de 1997 o extinto jornal Feira Hoje, diário que circulava aqui na Feira de Santana, divulgou um balanço da violência no primeiro semestre daquele ano. Comparando com o ano anterior, houve elevação: foram 77 homicídios e três latrocínios na primeira metade do ano; em 1996, os números foram mais favoráveis: 67 homicídios e quatro latrocínios. Na soma, 80 mortes violentas no primeiro semestre de 1997 e 71 no mesmo período do ano anterior.
O levantamento também informava sobre as mortes em supostos confrontos com a polícia: foram 29 em 1996 e, no ano seguinte, o número caiu para apenas 16. Todos os números compunham os balanços regulares divulgados pela Secretaria da Segurança Pública desde aquela época. A principal manchete da página policial era preocupante: “Aumenta número de homicídios”.
Vinte anos depois a expressão para definir essas ocorrências mudou: transformou-se em crimes violentos letais intencionais, o CVLI, tão comum no jargão da imprensa. Mas não ficou só nisso: em termos quantitativos, os crimes mais que dobraram em relação àqueles anos: 191 no primeiro semestre de 2017 e 193 no mesmo período do ano passado. O número – altíssimo – foi celebrado como estabilização nos índices.
A boa notícia é que, pelo menos, as polícias permanecem matando, oficialmente, em patamares próximos aos daquela época: foram 22 mortos em 2017 e 26 no ano anterior, 2016. Apesar das diferenças, as médias estão próximas nesse horizonte de duas décadas.

Crescimento

Comparando os seis primeiros meses de 2017 com idêntico período de 1997, o crescimento dos assassinatos é impressionante: 138%. Mas é ainda pior quando se compara o ano passado com 1996: inacreditáveis 171% de aumento. Explicações – boa parte delas sem nenhum tipo de fundamento – foram sendo forjadas com o passar dos anos e com o crescimento da violência.
O argumento eventual de que a população cresceu proporcionalmente é facilmente refutável. Em 1996, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estimou 450.487 moradores no município; 21 anos depois, a estimativa crava 627.477. É apenas 39,22% a mais em termos de população, bem distante do salto percentual na quantidade de homicídios.
Outras explicações foram se avolumando com o passar dos anos. As mais comuns sinalizavam para uma epidemia de crack – cujo impacto nunca foi devidamente dimensionado – e, mais recentemente, o surgimento e a consolidação das facções criminosas integram as explicações, corriqueiras, mas pouco fundamentadas.
Desde sempre Feira de Santana desfrutou de uma deplorável fama acerca de seus índices de criminalidade. Nos primórdios, em grande medida, talvez houvesse uma dimensão folclórica, de fama injustificada. Hoje, não: o temor é compreensível, mas pouco se discute que os assassinatos são localizados, com recortes geográfico, de gênero e social. Afetam mais os moradores da periferia ou de bolsões de pobreza, homens afrodescendentes com baixa escolaridade, desempregados e, sempre se deduz, envolvidos com a criminalidade.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Parlamento não digere a democracia virtual

A tentativa do Congresso Nacional de cercear a liberdade de opinião através da Internet é ao mesmo tempo preocupante e alvissareira. Preocupante por motivos óbvios: trata-se de mais uma ingerência – ou tentativa – da classe política de cercear a liberdade de opinião que a Constituição de 1988 prevê e que, até recentemente, era exercida apenas pelos poucos “privilegiados” que tinham acesso aos meios de comunicação convencionais, como jornais impressos, emissoras de rádio e televisão. Por outro lado, é alvissareira por dois motivos: primeiro porque o acesso e o uso da Internet como meio de comunicação no Brasil vem se difundindo, alcançando dezenas de milhões de brasileiros que integram o universo de “incluídos digitais”. Segundo, porque a expansão já causa imensa preocupação na Câmara e no Senado, onde se tenta forjar amarras inúteis no longo prazo. Semana passada a ingerência e a incompreensão do que representa o fenômeno da Internet eram visíveis através das imagens da TV Senado:

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada feira-livre que mobilizava comerciantes e consumidores da região. Isso na época em que não existia a figura do chefe do Executivo, quando as questões administrativas eram resolvidas e encaminhadas pela Câmara Municipal.           

“Um dia de domingo” na tarde de sábado

  Foi num final de tarde de sábado. Aquela escuridão azulada, típica do entardecer, já se irradiava pelo céu de nuvens acinzentadas. No Cruzeiro, as primeiras sombras envolviam as árvores esguias, o casario acanhado, os pedestres vivazes, os automóveis que avançavam pelas cercanias. No bar antigo – era escuro, piso áspero, paredes descoradas, mesas e cadeiras plásticas – a clientela espalhava-se pelas mesas, litrinhos e litrões esvaziando-se com regularidade. Foi quando o aparelho de som lançou a canção inesperada: “ ... Eu preciso te falar, Te encontrar de qualquer jeito Pra sentar e conversar, Depois andar de encontro ao vento”. Na mesa da calçada, um sujeito de camiseta regata e bermuda de surfista suspendeu a ruidosa conversa, esticou as pernas, sacudiu os pés enfiados numa sandália de dedo. Os olhos percorriam as árvores, a torre da igreja do outro lado da praça, os táxis estacionados. No que pensava? Difícil descobrir. Mas contraiu o rosto numa careta breve, uma express