Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de abril, 2009

Ecos da feira no centro da cidade

No dia 10 de janeiro de 1977 a Feira de Santana começou a perder um pouco de sua identidade. Naquele dia, os cerca de quatro mil barraqueiros que se espalhavam pelo Mercado de Arte e calçadões próximos, pela Praça João Pedreira e adjacências, mercadejando de um tudo, foram removidos para o novíssimo Centro de Abastecimento localizado no Parque Manoel Matias. A iniciativa compunha o Plano Local de Desenvolvimento Integrado, do então prefeito José Falcão da Silva. Acabava-se o lufa-lufa dos verdureiros das calçadas do Mercado de Arte, o cortar frenético dos animais nas bancas de carne verde, a exposição nas barracas de artigos de couro e barro, desaparecia o cheiro do peixe-frito que acompanhava as generosas doses de aguardente com ervas aromáticas, silenciaram os violeiros e repentistas e os vendedores de cordel de Lampião foram forçados a recolher seus produtos de papel pardo. A perspectiva, a partir daquela data, era de que o centro da cidade ganhasse ares modernosos. Sumiriam as bar

Diversificando a economia: a oportunidade que a crise nos dá

É muito comum se afirmar que Feira de Santana conseguiu se consolidar como uma das mais importantes cidades do interior do Nordeste em função de sua localização estratégica privilegiada. Afinal, para aqui convergiam as boiadas do Piauí e de Goiás com destino aos mercados consumidores de Salvador e do Recôncavo; por aqui transitavam os mercadores em direção aos sertões, à cata de oportunidades de negócios; e aqui, por fim, começou a se desenvolver uma feira-livre cuja fama ainda persiste, embora tenha se adaptado à mais moderna configuração urbana. Nesse processo que se arrastou por séculos o comércio se consolidou e, com ele, o antigo arraial foi se transfigurando, ganhando contornos da cidade, incentivando o sedentarismo de muitos mercadores, constituindo rota obrigatória de muitos outros que não perdiam as feiras-livres realizadas semanalmente. No século XX começaram a prosperar os fabricos, estruturas industriais familiares voltadas para atender à crescente c

O futuro das feiras-livres

Os rumos das atividades comerciais são ditados pelos hábitos dos consumidores. A constatação, que é óbvia, se aplica até mesmo aos gêneros de primeira necessidade, como os alimentos. As mudanças no comportamento dos indivíduos favorecem o surgimento de novas atividades comerciais, assim como põem em xeque antigas estratégias de comercialização. A maioria dessas mudanças, porém, ocorre de forma lenta, diluindo a percepção sobre a profundidade e a extensão. Atualmente, por exemplo, vivemos a prolongada transição que tirou as feiras-livres do centro das atividades comerciais. A origem das feiras-livres como estratégia de comercialização surgiu na Idade Média, quando as cidades começavam a florescer. Algumas das maiores cidades européias modernas são frutos das feiras que se organizavam com o propósito de permitir que produtores de distintas localidades comercializassem seus produtos. As distâncias, as dificuldades de locomoção e a intermitência das safras exigiam uma solução que as feiras

A Micareta sofre de esgotamento cultural?

Nos próximos dias Feira de Santana será palco de mais uma Micareta. Outras cidades baianas também promovem carnavais fora de época para evitar a concorrência da capital, que monopoliza boa parte do público e os grandes artistas. Ao longo do ano há carnavais extemporâneos em capitais brasileiras, que assim reproduzem a estrutura da micareta feirense - por ser a pioneira -, também contratando os mesmos artistas e recorrendo a estruturas muito semelhantes. A semelhança no formato das festas permitiu que certas empresas se especializassem na promoção desses eventos, consolidando o que hoje se conhece como “indústria do entretenimento” ou “indústria do carnaval”. Espalhada pelo país, a atividade movimenta bilhões de reais todos os anos. O setor mais forte dessa indústria é, naturalmente, a prestação de serviços. Mas de serviços altamente especializados, que envolvem, por exemplo, o encantamento do cliente que opta por acompanhar a folia aboletado num camarote. Nes

Patranhas do (Sub)desenvolvimento

Durante muito tempo se cultivou a idéia de que o desenvolvimento econômico era assunto para os técnicos do governo. E somente para eles. Detentores de um conhecimento transcendente e esotérico, esses profissionais tinham como atribuição determinar os rumos da sociedade e tomavam decisões que afetavam a todos os cidadãos. Nem sempre acertavam e nem sempre tinham o conhecimento que alegavam, mas como o tema era tratado apenas nos gabinetes dos governantes, cabalisticamente, os erros eram atribuídos ao imponderável. Só que as sociedades vão mudando. E mudam tanto que, às vezes, as propostas abalizadas de ontem transformam-se, hoje, em retórica ultrapassada. Quando esta retórica é aplicada à realidade, sempre causa prejuízos. E quem arca com os prejuízos é a sociedade. Antigamente os desastrados responsáveis pelas idéias equivocadas escondiam-se nos respectivos gabinetes. Se o dano era maior, recorriam aos padrinhos políticos que, se tinham cacife, sustentavam-nos nos cargos. Mesmo quando

O centro de Feira e o Centro de Abastecimento

Um fenômeno que atinge boa parte das metrópoles brasileiras é a decadência dos antigos centros comerciais ou regiões centrais das cidades. Em inúmeras delas as atividades econômicas deslocaram-se aos poucos para novos espaços, dotados de infra-estrutura mais adequada e que não enfrentam os gargalos das vias mais tradicionais (como as ruas estreitas que dificultam o fluxo de veículos ou as limitadas possibilidades de intervenção em locais onde existe patrimônio arquitetônico), tornando-se imediatamente atraentes para empresários e consumidores. Esse fenômeno começou há décadas e atualmente mostra algumas de suas conseqüências. A mais evidente delas é a decadência que caracteriza os antigos centros comerciais. Prostituição, consumo e tráfico de drogas passaram a ser traços marcantes desses locais, que em função do abandono e do descaso tornaram-se atraentes para mendigos e outras pessoas socialmente excluídas. Com o deslocamento ou a fixação de grandes empreendimentos (inclusive as ativi

A decadência dos clubes sociais

O anúncio da venda do Clube de Campo Cajueiro (CCC), em Feira de Santana, me fez recordar um artigo publicado há dois anos, na Tribuna Feirense, tratando da questão. Conforme pode se ver abaixo, apontávamos que a decadência dos clubes era irreversível, por mais esforçados que tenham se tornado seus dirigentes. O CCC é um exemplo disso. Aproveitamos a oportunidades para reapresentar o texto: No passado, em época de Micareta, os clubes sociais de Feira de Santana atingiam o ápice anual do glamour. A elite local exibia seu luxo em festas que reuniam os ricos do município para inveja da multidão de pobres que não podia desfrutar do mesmo luxo. Hoje a situação é totalmente diferente e os clubes sociais não promovem bailes concorridos pelos mais elegantes e nem dispõem de blocos próprios, onde se acotovelava a “juventude dourada”, ávida por demonstrar que constituía parte da “nata” da sociedade local. O desprestígio e a decadência dos clubes sociais, porém, não é um fenômeno restrito a Feir

O amendoim cozido da Queimadinha

Os vendedores ambulantes de amendoim aos poucos estão se incorporando à cultura da Feira de Santana. Gradativamente vão ganhando dimensão, pois se impõem aos olhos dos feirenses que circulam pelas avenidas da cidade e se acotovelam nos pontos de ônibus. Impõem-se aos olhos e ao paladar, já que as porções de amendoim vendidas a um real caíram no gosto do feirense e com o passar dos anos os vendedores se multiplicaram. Não resta dúvida de que a prefeitura lavrou um tento – conforme diziam os cronistas esportivos antigamente – ao inaugurar o barracão para lavagem e cozimento do produto no bairro Queimadinha, onde residem muitos dos vendedores que circulam pelo centro da cidade. A forma artesanal e precária empregada para preparar o amendoim – através de fogueiras na porta de casa, alimentadas com lenha – expunha os vendedores ao risco de acidentes e favorecia o manuseio e preparo inadequados do produto. Quem já viu o processo nas ruas do bai

Bolsa-Família: êxito e reflexões

Informações divulgadas há alguns dias pelo Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) confirmam que a Bahia foi o estado mais beneficiado pelo Programa Bolsa-Família em 2006. Do total de recursos destinados ao programa, cerca de R$ 1 bilhão (ou 13,2% do total) foram direcionados para o estado. Bastante à frente de Minas Gerais (com R$ 752 milhões), São Paulo (R$ 673 milhões) e, mais distantes, Pernambuco e o Ceará. Coube ao Nordeste a maior fatia (52,5% ou R$ 3,95 bilhões). Feira de Santana está entre os municípios contemplados pelo programa. Conforme dados do MDS, no ano passado foram concedidos 40.790 benefícios, distribuídos entre bolsa-escola, auxílio-gás e bolsa-alimentação. O órgão calcula que há exatas 45.206 famílias com renda per capita inferior a R$ 175 e que 43.518 possuem renda per capita inferior a R$ 120. Com base nessas informações constata-se que o grau de cobertura do programa junto à população apta para o benefício é elevado. Outro aspecto positivo é que a eficiência

Caprinocultura e desenvolvimento local

O Semi-Árido da Bahia sempre foi visto como uma região que oferece escassas oportunidades econômicas. Ao longo de séculos, a que desfrutou de maior sucesso relativo foi a bovinocultura. Mas essa era uma atividade que se articulava com os centros urbanos do litoral, ofertando proteína animal para a população dedicada à lucrativa produção de cana-de-açúcar exportada para os mercados europeus. Mas mesmo essa bovinocultura enfrentava imensas dificuldades, dada a constância das estiagens que assolavam a região, dizimando rebanhos e, muitas vezes, colocando em risco a sobrevivência dos sertanejos. Note-se, também, que a criação de gado enfrentava outras limitações decorrentes da escassez de chuvas: tinha maior possibilidade de sucesso próximo às fontes naturais de água – como rios e lagoas – e exigia amplos espaços para prosperar, já que a pastagem rala impunha grandes deslocamentos para os animais, tornando-a extensiva. Fica fácil compreender o atraso da região ao longo de tantos anos. Cont

A feira nossa de cada dia

Interessante o anúncio da Prefeitura Municipal de que vai colocar uma cobertura na feira-livre do bairro Estação Nova. Há muitos anos aquele espaço merece maior atenção das autoridades municipais. A mais óbvia das razões é que o comércio no local tem se intensificado e a feira, que antes acontecia apenas ao domingos, começa a mobilizar comerciantes durante todo o final de semana. Até em dias úteis há algum movimento, com gente comprando e vendendo. Outra razão é a distância daquela região do principal entreposto comercial da Feira de Santana, o Centro de Abastecimento. Residindo mais distantes, as pessoas optam por adquirir gêneros nos mercados e feiras mais próximos de casa, por três motivos: pela comodidade de não se deslocar carregando peso, pelo tempo exigido para ir ao CAF e voltar e pela precariedade do sistema de transportes, que dificulta os deslocamentos. A distância explica também parte do êxito de duas outras importantes feiras-livres da Feira de Santana: a da Cidade Nova e

Crônica tirada de uma propaganda de jornal

A preservação da História e o aprendizado que dela se pode extrair são fatores que contribuem para o desenvolvimento de um país, de uma região ou até de uma localidade. No Brasil, felizmente, temos despertado nos últimos anos para a importância da conservação da nossa História em suas múltiplas dimensões. Mesmo em Feira de Santana, que tem se notabilizado pela demolição de imóveis antigos para dar lugar a estacionamentos rotativos, há iniciativas ainda isoladas dignas de elogios. Uma delas, recente, partiu da Fundação Senhor dos Passos de lançou uma publicação reunindo exemplares de jornais que circularam em Feira de Santana entre os anos de 1877 e 1888. Assim, os feirenses dos dias atuais podem saber o que ocorria na cidade lá pelo final do século XIX através das páginas de publicações como “O Progresso”, “O Motor”, “Echo Feirense”, “Cidade da Feira” ou “O Vigilante”, para citar apenas algumas publicações. No Brasil de pouca leitura, muitos pensam que conhece

O “show” dos prefeitos

Embora a crise econômica que assola o mundo tenha sido gerada na esfera circunscrita dos grandes financistas e executivos de inquestionável competência, encastelados em edifícios envidraçados dos centros financeiros do primeiro mundo, o fato é que a crise atingiu a todos. Alguns, com mais força, outros com menor intensidade. Na média, em geral, todos saíram perdendo alguma coisa. Basta acompanhar os indicadores econômicos divulgados diariamente e que, quase sempre, registram quedas bruscas na atividade econômica. Muitos trabalhadores já perderam emprego e, na Bahia, houve fechamento de fábricas e redução no número de empregados em muitas delas. A festejada indústria automotiva baiana nega que vá demitir, mas já anunciou um plano de demissão voluntária. O desemprego nesses setores provoca efeitos em cascata, atingindo trabalhadores empregados em outros setores. Trocando em miúdos, o saldo negativo entre admissões e demissões provoca redução no ritmo da atividade

O Feirense e o debate sobre as questões urbanas

Durante décadas Feira de Santana viveu um acelerado crescimento populacional que se deveu não apenas às elevadas taxas de natalidade vigentes no País, como também à migração. Os fluxos migratórios afluíram dos pequenos municípios e da zona rural da própria Bahia, mas também de estados vizinhos, como Pernambuco, Sergipe, Ceará e Paraíba. Reunidas, essas pessoas foram construindo a cultura heterogênea, mas essencialmente sertaneja, que é um dos traços característicos da chamada Princesa do Sertão. Nas duas últimas décadas caiu o número de filhos por mulher, devido à elevação da escolaridade feminina e às iniciativas de planejamento familiar e reduziu-se o movimento de migrantes, em função da consolidação da transição urbana e à diminuição dos atrativos econômicos das grandes cidades. Esse longo processo – acelerado em alguns momentos, mais lento em outros –legou um conjunto de problemas de infraestrutura que exigem, até os dias atuais, a contínua intervenção dos governos. Mais do que iss

Uma das passagens mais caras do Brasil

Foi lamentável a pichação no prédio da Prefeitura Municipal, reformado recentemente, em protesto pelo aumento que se aproxima no preço das passagens de ônibus. Mas, mais lamentável ainda, foi a reunião do Conselho Municipal de Transportes, às vésperas do longo feriado de Micareta, para decidir pelo aumento no valor da tarifa, proposto para subir dos atuais R$ 1,85 para R$ 2,00. A finalidade foi, sem dúvida, atenuar o desgaste junto à população, particularmente a classe estudantil. Aliás, essa prática tem precedente, já que tempos atrás houve reunião para tratar do mesmo assunto às vésperas do reveillon. A elevação dos preços de tarifas públicas é sempre uma medida impopular. Mas quando ocorre dessa forma, às escondidas, aproveitando-se de feriados prolongados, só pode significar covardia ou a consciência de que a qualidade do serviço prestado à população não é compatível com o preço e que o momento de crise econômica não é oportuno para medidas dessa natureza. Confirmando-se o reaju