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O “apagão” chinês em Feira

Apesar das nuvens acinzentadas que cobriam o horizonte, ontem (21) o crepúsculo em Feira de Santana foi espetacular. Longo, repleto de cores e tons imperceptíveis que a monótona iluminação elétrica costuma embaçar. Aos poucos, à medida que as últimas luzes do dia se diluíam na amplidão, o casario feirense foi sendo envolvido por uma densa penumbra acinzentada que os faróis dos carros feriam fragilmente. Até a sinfonia das cigarras soou diferente no entardecer de ontem.
Quando a noite caiu em definitivo, estrelas improváveis – muitas delas habitualmente ofuscadas pela iluminação urbana – despontaram no céu. A lua, crescente, destacava-se com muita nitidez. No final da tarde, provocava intenso efeito estético sob o céu azul, puríssimo, de verão, apesar de o calendário assinalar o início do outono.
Até o decalque daquela porção da lua encoberta pela sombra era visível, invocando mistérios milenares. O céu perdeu aquele tom escuro – mas esverdeado – das noites feirenses e um pretume intenso, natural, despertou a atenção. Até a energia elétrica retornar – isso às 19h30 – o espetáculo se estendeu grandioso.
Pelas ruas feirenses, porém, a preocupação era outra: chegar em casa, porque a interrupção da energia elétrica exatamente às 15h48 provocou o caos, sobretudo no centro da cidade. Houve quem sustentasse a rotina: gente passeava com cachorro, andava, corria, pedalava com despreocupação. Os exasperadores engarrafamentos e os faróis acesos, no entanto, sinalizavam que a tarde era excepcional e muita gente, tensa, tentava retornar para casa.

“Apagão chinês”

A notícia de que o apagão era geral correu de forma quase instantânea. Logo o sinal dos aparelhos celulares caiu. E quem manuseia esses equipamentos de forma compulsiva experimentou um intenso desconforto. A princípio, teclava-se, tentava-se acionar os aplicativos dos aparelhos, com expressão de desalento.
Depois – e à medida que o “apagão” se estendia – resgatou-se um antigo hábito, quase esquecido: conversar. Aqui e ali, formavam-se grupos que iam proseando, entabulando o papo pouco habitual desses tempos de frenética imersão digital. Até aquela correria desenfreada doa dia-a-dia cessou, estendendo-se até à noite, quando as ruas ficaram desertas, sob espantada quietude.
Oficialmente, ocorreu uma falha numa linha de transmissão em Belo Monte, no Pará, provocando o transtorno que alcançou todas as regiões do País, mas, sobretudo, o Norte e o Nordeste. Prometem-se apurações para os próximos dias e resultados até a próxima quinzena. Quem opera o sistema é a empresa chinesa State Grid, novidade gerencial adotada para o setor elétrico brasileiro nos últimos tempos.
Segundo matéria divulgada pelo site da Central Única dos Trabalhadores – CUT, a empresa realizava testes em horário comercial, quando aconteceu o “apagão”. Críticas ao episódio, evidentemente, serão desencorajadas: afinal, o erro foi de uma empresa privada e quem está na alça de mira é a Eletrobrás, que Michel Temer (MDB-SP), o mandatário de Tietê, tenta desesperadamente privatizar.
É de arrepiar imaginar que, no futuro próximo, poderemos ter padrão de qualidade chinês na operação de todo o sistema elétrico do País...

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