Em
literatura sempre tive inclinação por autores que foram jornalistas. No começo
não houve, aí, um movimento deliberado, óbvio. Só tempos depois, quando já
agregara ao currículo um acervo razoável de obras lidas – para os padrões de um
principiante –, é que fui me dar conta da coincidência. Entre os brasileiros,
comecei por Graciliano Ramos, que na juventude mourejara em banca de revisão de
jornais do Rio de Janeiro. O estilo seco e a escassez de adjetivos, para mim, representaram
uma experiência muito marcante.
“São
Bernardo” e “Vidas Secas” trazem muito desse estilo seco, da economia de
palavras comum ao jornalismo. Em ambas as obras se nota o esforço tenaz para
suprimir tudo aquilo que não é indispensável, essencial, imprescindível. É
óbvio que o texto magistral e a imersão na análise psicológica das personagens
vão muito além do jornalismo, torna-os obras literárias perenes. Mas há, aí, o
gene jornalístico, sem dúvida.
Depois
– quando já estava na redação do extinto Feira Hoje – investia parte do salário
numa daquelas coletâneas de grandes autores que se vendiam em bancas de jornal.
Através de uma delas fui apresentado a Albert Camus, o notável escritor
franco-argelino. “O Estrangeiro” – uma das mais importantes estreias da
literatura mundial – me fascinou logo nas primeiras frases.
O
magnífico romance sobre um sujeito mediano, exposto a uma rotina enfadonha, e que
depois mata um árabe da praia, foi impactante. Afinal, como é que alguém
conseguia dizer tanta coisa – e, sobretudo, estimular a imaginação do leitor –
escrevendo magras cem páginas? Levou tempo, mas mais à frente fui aprendendo –
principalmente em relação ao jornalismo – que recorrer às expressões precisas e
ao formato enxuto comunica mais que as narrativas caudalosas, que as torrentes de
palavras.
Naquela
mesma época li “O Velho e o Mar”, de Ernest Hemingway. À semelhança de Camus,
também ele militara no jornalismo. Essa militância legou evidente influência
sobre sua literatura: seu mais destacado romance – uma novela, sob critérios
mais rigorosos –, “O Velho e o Mar”, é um relato curto, sem firulas, sobre a
pesca de um peixe gigantesco por um velho pescador solitário.
Hemingway
viajou pelo mundo e produziu reportagens em vários continentes. Ele até se
aventurou pela formulação teórica, lançando uma coleção de regras que deveriam
ser aplicadas no cotidiano do jornalismo. A concisão e a objetividade,
obviamente, figuravam entre as recomendações, que o acompanharam também quando
abandonou as redações para se dedicar à literatura.
Anos
depois, quando percebi a feliz convergência entre jornalismo e minhas
predileções literárias, dediquei mais atenção aos autores que encararam a
labuta das redações em algum momento da vida. Entre eles, Gabriel Garcia
Marques, autor do monumental “Cem anos de solidão”. Esse, o avesso daquela
literatura concisa, mas jornalista mesmo enfronhado no realismo fantástico.
Essa
gente produziu literatura a partir de trajetórias jornalísticas. Mas houve
gente que produziu jornalismo com alta qualidade literária. Também me aventurei
lendo gente do naipe de John Reed e Truman Capote, dois jornalistas
norte-americanos dos mais brilhantes. Eles, porém, ficam como matéria-prima
para um próximo artigo...
Comentários
Postar um comentário