Tudo
indica que, a partir daqui, quem acompanha o noticiário político vai precisar
prestar atenção nos rumores que vêm dos quartéis. Afinal, um general anunciou a
possibilidade de uma “intervenção militar” caso o Judiciário falhe na sua
missão de combater a corrupção. Passível de punição pelas declarações, o
militar teve suas palavras relativizadas pelo chefe numa entrevista. Este até
saiu arranjando justificativas, colocando panos quentes, negando punição, quase
aquiescendo.
Acuado,
o ministro da Defesa, Raul Jungmann, saiu com uma nota chocha, protocolar,
evasiva, acomodatícia. E o chefe supremo das Forças Armadas – Michel Temer
(PMDB-SP), o mandatário de Tietê – ouviu calado toda a afronta. Sequer franziu
o cenho, fez os consagrados muxoxos e – menos ainda – encenou arroubos
retóricos com aquele vocabulário de rábula do século XIX.
Desde
os primeiros momentos da ascensão emedebista que ficou patente o medo do
mandatário de Tietê dos militares. Primeiro, livrou-os da reforma da
Previdência com desculpas esfarrapadas; mais recentemente, encampou um reajuste
para a categoria, sonegando o mesmo para os demais servidores da União. Difícil
demonstração mais eloquente de medo.
Os
comentários despretensiosos, quase devaneios, sobre “intervenção militar”
inauguram um novo capítulo no derrocada antidemocrática que o Brasil
protagoniza. Primeiro, foi o controverso impeachment,
capitaneado por corruptos contra a corrupção; desde então, avolumou-se a
escalada contra direitos elementares dos brasileiros; agora é a vez do discurso
da retórica moralizadora que justifica a “intervenção militar”.
Ditadura?
Os
desavisados adeptos da tutela do coturno alegam que às Forças Armadas caberia a
nobre função de “limpar” o Brasil dos corruptos civis. Foi o mesmo argumento
empregado em 1964: parte do que legaram, todavia, foram os coronéis civis, hoje
caquéticos, que durante décadas dominaram a política do País. Bem mais
corruptos que os defenestrados à época.
A
crença envolve, portanto, mais uma questão de fé que mera ignorância sobre a
História recente do Brasil. Afinal, coletivamente, o brasileiro não amadureceu
o suficiente para tomar as rédeas do seu destino: desde sempre recorre à
tutela, à governança autoritária, às soluções mágicas e, invariavelmente,
catastróficas. Tudo para fugir de suas responsabilidades intransferíveis.
Descontando
uns poucos jornalistas mais responsáveis, as declarações dos militares estão
sendo encaradas com desconcertante naturalidade pela imprensa e pela própria
sociedade. Alguns parecem ansiosos pela instituição de uma nova ditadura.
Outros não conseguem dimensionar a extensão de uma transição, sem subterfúgios,
para um regime de exceção.
O controverso impeachment costurado por corruptos
notórios – alguns deles já presos, inclusive – e a naturalidade com que as
especulações sobre a “intervenção militar” são recebidas mostram que o recreio
democrático que se estendeu durante 30 anos no Brasil estertora desde o ano passado.
Dá para reverter? Só com o povo na rua. Mas aí já são outros quinhentos...
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