Michel
Temer (PMDB-SP), o mandatário de Tietê, bravateou ontem
em pronunciamento vespertino: disse que não renuncia ao cargo de presidente da
República. O simples fato de ser forçado a afirmar isso, com medíocre ênfase teatral,
sinaliza que deu os primeiros passos em direção ao cadafalso. Os mais otimistas
o enxergam como um cadáver político: mexe-se, move-se pela inércia do cargo,
mas já morreu: qualquer hora dessas desaba definitivamente. Outros, mais ponderados,
ainda não o veem como um cadáver talhado em versão final. Mas farejam, aqui ou
ali, o marcante odor pútrido dos finados.
Ironicamente,
há um ano, quase todo mundo aderia ao novo regime erigido sobre os escombros do
petismo, defenestrado como símbolo da corrupção e incompetência. Aquilo lá,
aquela fanfarronice impudente, prometia se estender até 2018, num prazeroso
rateio de cargos e verbas. Mas ontem as primeiras ratazanas já abandonavam os
porões palacianos, temerosas que o incêndio lhes chamusque o pelo. Afinal, não
querem arriscar reeleição defendendo governo impopular.
Somente
a aversão de certos segmentos ao petismo e a rígida blindagem da imprensa
justificaram até aqui tanta condescendência com o mandatário de Tietê.
Ministros encrencados em escândalos de corrupção? Ele tem diversos; auxiliares
próximos enroscados em episódios nada edificantes? O Palácio do Planalto abriga
vários. Promessas delirantes de recuperação econômica que não saem do papel?
Ele renova o estoque todos os dias. Mesmo assim a paciência persistia,
inabalável.
Até
anteontem. Pilhado numa conversa nada republicana – para ser elegante – com um
empresário às voltas com a Justiça, o mandatário de Tietê recorreu à bravata
mencionada acima. E àqueles expedientes que buscam tergiversar, tangenciar. Até
aqui funcionou pouco: pipocaram pedidos de impeachment,
manifestações em várias partes do país e as primeiras ratazanas, conforme
mencionado, desembarcaram. E outras sinalizam o desembarque.
Pela rua
Fiquei
atento aos comentários do povo pela rua: “Não diziam que eram os outros que
roubavam? Agora é a vez deles”, comentou uma senhora, num ponto de ônibus.
Muita gente em torno e nenhuma discordância: houve quem sorrisse, concordando.
Um rodoviário comentou com o colega: “Quero ver o que vão dizer agora. Eles
também roubam”. Um garçom, à noite, declarava ostensivamente voto no PT.
São
aqueles eleitores de Lula, que andavam ressabiados, começando a reaparecer.
Nada garante que Lula vá ser candidato, nem que vá ganhar a eleição: mas o
monopólio da moral e da ética que a situação de hoje empunhava com tanta
sofreguidão, há um ano, pelo que se percebe, nunca passou de empulhação. Mas
muitos, coitados, acreditavam nisso e foram às ruas, defender a ética que gente
como Aécio Neves (PSDB-MG) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ) encarnavam.
Baqueando,
Michel Temer lembra cada vez mais o governo Dilma Rousseff nos seus últimos
dias. Até mesmo em relação às personagens: depois de passar a rasteira na
petista, o usufrutuário Eduardo Cunha, mesmo condenado e preso, é o responsável
– aparentemente involuntário – pelo tranco que lançou o mandatário de Tietê às
cercanias do cadafalso.
A Era Cunha – quem diria –
parecia enterrada com a prisão do seu artífice. Coisa nenhuma: mesmo restrito
aos exíguos espaços do seu presídio lá no Paraná, ele ainda é capaz de provocar
cataclismos na política brasileira. Sobretudo em relação a Michel Temer, que
deve o mandato graças às competentes articulações do então aliado. Agora, é
aguardar para ver até que ponto a lama efervesce...
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