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Reforma trabalhista é a revogação da Lei Áurea

Depois de uma manobra digna de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) – a urgência da votação da matéria foi rejeitada num dia e, no outro, reapresentada e aprovada – a draconiana reforma trabalhista está quase pronta para ser votada na Câmara dos Deputados. São mais de cem mudanças que, na prática, revogam a antiga Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O conteúdo das mudanças é tão assustador que, para o brasileiro que precisa vender sua força de trabalho, talvez fosse mais negócio a revogação da Lei Áurea e o retorno à escravidão.
Boa parte dos direitos que foram sendo assegurados ao longo de décadas de luta estão sendo revogados. Um deles é a redução do salário: a partir de agora, vai bastar diminuir e contratar de novo via terceirização ou contrato individual, para pagar menos do que se pagava antes pelas mesmas atividades. Atravessaremos uma era de intensa compressão salarial.
A contratação temporária permitirá abandonar o despropósito de se recolher FGTS e Previdência. Quem assinar um desses contratos sequer vai poder reclamar na Justiça do Trabalho: a nova legislação não permite interferências sobre acordos individuais selados entre as duas partes, mesmo que sejam impostas regras draconianas. Na prática, a Justiça do Trabalho vai deixar de fazer sentido. E direito de trabalhador, obviamente, também.
Outra novidade importada da Idade Média é a remuneração do teletrabalho por tarefa e não por jornada. Especialistas enxergam na manobra mais um mecanismo para comprimir a remuneração do trabalho, inclusive normalizando a remuneração abaixo do salário-mínimo. Ao que tudo indica, a propósito, salário-mínimo vai se tornar luxo no vindouro futuro temerário.

Barbárie

Os congressistas, enlameados nesses sucessivos escândalos de corrupção que estão vindo à tona, já sinalizaram, diversas vezes, disposição de cruzar a linha entre a civilização e a barbárie. Foi assim com o exultado Teto de Gastos, com a medieval terceirização e, lá adiante, com a reforma da Previdência, que deve ser votada em maio. O salto definitivo em direção à barbárie, porém, parece que vai ser dado com a pretensa reforma trabalhista.
Alavancada por empresários imbecis e políticos microcéfalos, a reforma vai arrochar furiosamente os rendimentos dos trabalhadores; com menos renda, há menos consumo; com menos consumo, menos lucro, menos imposto, menos investimento, menos desenvolvimento. A mais, só a barbárie, as tensões sociais e as potenciais convulsões.
O assalto aos direitos trabalhistas vem – sem nenhum acaso – num momento de profundo desarranjo das organizações dos trabalhadores e de intensa desmobilização de classe. Isso combinado a um Congresso composto por uma ampla maioria conservadora, que não deve enfrentar grandes dificuldades para impor esses imensos retrocessos aos brasileiros. Explosiva, a receita deve resultar em consideráveis prejuízos no curto prazo.
Dizem que a votação vai acontecer já amanhã. É necessária pressa, porque para a sexta-feira está programada uma Greve Geral. Com ela, muitos podem despertar para os atentados a seus direitos, alimentar o embrião da resistência. Antecipando o golpe rasteiro, os deputados argumentarão que já foi votado, que não há mais o que fazer. Mais do que revogar a CLT, parece que estão revogando é a Lei Áurea.

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