Enquanto
o feirense se ocupava com as aporrinhações e temores decorrentes do novo
coronavírus, a natureza concluiu a transição do verão para o outono. Não
faltaram as afamadas águas de março: choveu com frequência ao longo do mês e,
às vésperas do outono, tempestades se insinuaram na borda do céu, a oeste, lá
pros lados do rio Jacuípe. Mas as chuvas não vieram nos começos de noite da
semana passada. Restaram os relâmpagos espetaculares – alguns, tremendos,
lançando fachos de luz em quadrantes inteiros do céu – e o calor incômodo.
Os
ventos fortes também chamaram a atenção nas madrugadas. Sacudiram vidraças,
assoviaram sinistramente, balançaram com violência as copas das árvores. Depois
foram serenando e, por fim, desapareceram. Com eles, veio o aguardado declínio
da temperatura. As noites e o começo das manhãs se tornaram agradáveis, cálidos.
Os
mais velhos apostam em safra boa no inverno. Invocam, para tanto, a ancestral
sabedoria decorrente de argutas observações. É por isso que muita gente na zona
rural já cavouca a terra úmida, plantando o milho e o feijão. Daqui a alguns
meses esses produtos deverão chegar à mesa dos feirenses.
Só
não faz muito sentido é falar nos festejos juninos que já se avizinham.
Tudo
por conta da epidemia do coronavírus, o Covid-19. Muitos prefeitos já se
anteciparam, anunciando o cancelamento dos festejos. Intuem o fracasso:
aglomerações, até lá, implicarão em alto risco de contágio. E talvez as festas
sejam esvaziadas – caso a epidemia decline rápido, o que é improvável –, já que
muita gente seguirá temerosa de contrair o vírus. Vai ser grande o baque sobre
a economia da região.
A
situação, porém, não credencia tresloucados a questionar as medidas de
isolamento social recomendadas por autoridades sanitárias. Ignoram os trágicos
exemplos lá de fora e replicam o discurso de Jair Bolsonaro, o “mito”. Alegam os
danos que a economia vai sofrer com o isolamento social. Iludem-se: os danos,
incontornáveis, virão de qualquer forma. Não há como fugir da recessão.
Manter
tudo funcionando, como se não houvesse uma terrível pandemia em curso, vai
multiplicar o número de mortes. Quem morrerá como mosca? O preto, o pobre, o
periférico, como sempre. É ele que vive em locais insalubres, que não dispõe de
álcool gel, sabão e até mesmo água para assegurar a higiene.
Os
donos do dinheiro, porém, estão se lixando para essa gente. Declarações que
evidenciam isso se avolumam desde o começo da pandemia. Eles, a propósito,
insuflam as matilhas, mas não se expõem: estão bem abrigados em suas mansões, nos
seus carrões blindados, aguardando a desgraça findar. O hidrófobo que vá para a
rua, defender suas bandeiras, cultivar a ilusão de que integra a elite.
Não vai ser fácil o outono
para o brasileiro. Serão meses de sofrimento e de intensas turbulências
políticas. Quando a prateada garoa do inverno nos alcançar, lá adiante, com
certeza já não seremos os mesmos...
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