No fundo, é isso: a decoração natalina serve
para as selfies, que vão ficar em permanente
exibição nas mídias sociais. Quanto mais decorada a cidade – já há disputa até entre
prefeituras – mais fotos, mais repercussão e mais elogios. Reunir familiares,
amigos, conhecidos, colegas de trabalho para o tradicional autorretrato se
tornou um ritual. Quem não o faz é um insensível, não registra os bons momentos
da vida.
No interior do Brasil a iluminação à noite costuma
ser tristonha, até melancólica. Focos esparsos de luz espantam precariamente a
escuridão que sitia os pequenos lugarejos. Daí, talvez, a iluminação generosa,
o êxtase de crianças e adultos –muita gente grande infantiliza-se diante dos
pisca-piscas – e as entusiasmadas congratulações aos prefeitos no Natal de
luzes e cores.
Mas mesmo as metrópoles profusamente
iluminadas rendem-se aos apelos das selfies
sob as lâmpadas natalinas. É o caso de São Paulo, do Rio de Janeiro, mesmo das demais
metrópoles brasileiras. Parece que as silhuetas iluminadas das árvores, dos
anjos, dos reis magos, do Papai Noel, despertam um desejo irreprimível pelo
autorretrato. E revertem-se em popularidade para os prefeitos.
A pandemia que permanece aí e não acabou, os
brasileiros famélicos garimpando restos de comida, os biscateiros rotulados
como empreendedores, os desempregados e a iniqüidade no Planalto Central, nada
disso comove ou mobiliza o brasileiro. Só a decoração natalina para emprestar um
ar de novidade às irreprimíveis selfies.
Nesses insanos dezembros, daqui a pouco
começam a classificar decoração natalina como política pública. Nos
parlamentos, deputados apresentarão emendas, esfregando gostosamente as panças
nos balcões do toma-lá-dá-cá; prefeitos alicerçarão suas campanhas reeleitorais
com a decoração natalina; o povo, feliz, tratará de providenciar créditos para
os celulares, afoito para renovar seu repertório de autorretratos nas mídias
sociais.
Não falta quem enxergue vazio e vacuidade
nessa moda de filmar-se ou fotografar-se feito estrela de cinema o tempo todo. Tudo
bem. Mas, pelo que se percebe, o povo está marcado lá nas mídias sociais, mas
está feliz, conforme a clássica canção de Zé Ramalho...
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