Pular para o conteúdo principal

As antigas ruas de Orixás no Jardim Sucupira

 

Na segunda metade dos anos 1980 o Jardim Sucupira era um loteamento recente, com amplos terrenos baldios. Fica ali nas cercanias do Cemitério São Jorge e estende-se ao sul em direção à feirinha do Sobradinho, a leste rumo às Baraúnas, margeando a oeste a hoje movimentada rua Bartolomeu de Gusmão. Naquela época remota praticamente nenhuma via era pavimentada e havia grandes silêncios, solidão e pouco moradores.

A peculiaridade do bairro era os nomes das ruas. Todas elas faziam referências a Orixás, homenagem às crenças de matrizes africanas que se enraizaram na Bahia a partir do desembarque de pretos escravizados no Brasil Colônia. Entre outras, havia as ruas Xangô, Ogum de Ronda, Omolu, Oxossi Pena Branca, Ifá, Oxumaré.

A partir do começo dos anos 1990 e até a primeira metade da década seguinte, sucessivos projetos de lei apresentados por vereadores foram mudando os nomes das ruas.  Isso apesar de, ainda hoje, os nomes originais constarem em mapas consultados na internet e até na lei municipal 3.429/2013, que trata da planta genérica da Feira de Santana.

As duas primeiras mudanças foram ainda em 1992: as ruas Omolu e Ogum de Ronda tornaram-se, respectivamente, ruas Monte das Oliveiras e Carlos Fadigas. As leis ordinárias 1.581 e 1.585, do mesmo ano, oficializaram as modificações. Nos anos seguintes, essas alterações persistiram.

Em 1993 a lei 1.726 removeu o nome da rua  Oxumaré, que se tornou Rosa de Sarom. Cinco anos depois, em 1998, a rua Xangô tornou-se São Lucas, por meio da lei 2.010, do mesmo ano. Mais à frente, no começo da década seguinte, o serviço foi completado: a rua Ifá tornou-se Gilson Carlos Silva Pereira – lei 2.253 de 2001 – e, em 2005, a lei 162 transformou a rua Oxossi Pena Branca em Maanaim.

Conforme mencionado, quem pesquisa o mapa do Jardim Sucupira na internet depara-se com ruas cujos nomes antigos permanecem. Assim como na já citada lei 3.429/2013, a da planta genérica. No site dos Correios, porém, não há nenhum vestígio dos nomes antigos. Mais confiáveis, as informações da empresa postal devem refletir a realidade atual.

Há nomes originais que parecem ter sobrevivido. É o caso das ruas Nanã e Orixás. Nos arquivos da Câmara Municipal disponíveis para consulta digital, não há referência à mudança de nome desses logradouros. Consultando também o site dos Correios, é possível constatar que os nomes permanecem.

Em Salvador, sobretudo na Fazenda Grande do Retiro, mantêm-se os nomes alusivos aos orixás em algumas vias. Noutras cidades, como o Rio de Janeiro – aqui ou ali – também há referências. Mas a homenagem sistemática, feita só na Feira de Santana, deixou de existir ao longo dos anos. Restou, apenas, o triste exemplo do descaso e do desrespeito com as religiões de matrizes africanas...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada fei...

Placas de inauguração contam parte da História do MAP

  Aprendi que a História pode ser contada sob diversas perspectivas. Uma delas, particularmente, desperta minha atenção. É a da Administração Pública. Mais ainda: a dos prédios públicos – sejam eles quais forem – espalhados por aí, Brasil afora. As placas de inauguração, de reinauguração, comemorativas – enfim, todas elas – ajudam a entender os vaivéns dos governos e do próprio País. Sempre que as vejo, me aproximo, leio-as, conectando-me com fragmentos da História, – oficial, vá lá – mas ricos em detalhes para quem busca visualizar em perspectiva. Na manhã do sábado passado caíram chuvas intermitentes sobre a Feira de Santana. Circulando pelo centro da cidade, resolvi esperar a garoa se dispersar no Mercado de Arte Popular, o MAP. Muita gente fazia o mesmo. Lá havia os cheiros habituais – da maniçoba e do sarapatel, dos livros e cordeis, do couro das sandálias e apetrechos sertanejos – mas o que me chamou a atenção, naquele dia, foram quatro placas. Três delas solenes, bem antig...

Patrimônio Cultural de Feira de Santana I

A Sede da Prefeitura Municipal A história do prédio da Prefeitura Municipal de Feira de Santana começou há 129 anos, em 1880. Naquela oportunidade, a Câmara Municipal adquiriu o imóvel para sediar o Executivo, que não dispunha de instalações adequadas. Hoje talvez cause estranheza a iniciativa partir do Legislativo, mas é que naqueles anos os vereadores acumulavam o papel reservado aos atuais prefeitos. Em 1906 o município crescia e o prédio de então já não atendia às necessidades do Executivo. Foi, então, adquirido um outro imóvel utilizado como anexo da prefeitura. Passaram-se 14 anos e veio a iniciativa de se construir um prédio único e que abrigasse com comodidade a administração municipal. Após a autorização da construção da nova sede em 1920, o intendente Bernardino Bahia lançou a pedra fundamental em 1921. O engenheiro Acciolly Ferreira da Silva assumiu a responsabilidade técnica. No início do século XX Feira de Santana experimentou uma robusta expansão urbana. Além do prédio da...