“... Pois já vai terminando o verão...”
O
canto melancólico das cigarras vem tornando as manhãs mais tristes, apesar da
luz alegre do sol. O que às vezes espanta essa tristeza é o trinado do sabiá.
Ambos devem silenciar dentro de mais alguns dias porque, como bem diz a letra
de “As rosas não falam”, do imortal Cartola, transcrita acima, o verão vai
terminando. É o mais triste final de verão do Brasil nas últimas décadas. Por
aqui, ultimamente, sempre bate a sensação de que a esperança saiu de férias.
Sem perspectiva de retornar.
Parece
que o diabo zombou duas vezes do Brasil nos últimos tempos. A primeira foi em
2018, quando parte do eleitorado chancelou um pacto com a morte elegendo Jair
Bolsonaro, o “mito”, para a presidência da República. A segunda zombaria foi a
pandemia do novo coronavírus, que abalroou o mundo também. Aqui, combinados,
esses eventos malignos produziram todo esse horror que completou um ano. E, o
que é pior, sem perspectiva de acabar.
Em
“As rosas não falam” Cartola canta um amor que não é mais correspondido. Quem o
ouve sente a dor, o vazio, a tristeza, a desolação de quem foi abandonado e que
agora só tem as rosas, mudas, para se queixar. Piorando tudo, o verão que termina.
A canção – uma das mais belas da Música Popular Brasileira – é de uma
sensibilidade poética ímpar, marca registrada deste sambista genial. Mas
reflete apenas um drama particular. À volta do apaixonado, o mundo seguia seu
curso normal.
No
Brasil de hoje, cujo verão também já vai terminando, o drama é coletivo, por
mais que muitos desdenhem, façam pouco caso, só pensem no lucro. São funestas
as projeções para a pandemia em março, com suas águas que encerram o verão e
com o outono que já se descortina com temperatura mais amena, com luminosidade
magnífica. E sequer temos um Cartola para cantar nossas dores coletivas no
Brasil que emburrece e empobrece. Lá fora, o canto das cigarras tem um quê de
fúnebre.
Nossos
laços com a vida – que muitos querem suprimir, sufocar, extirpar – dependem,
agora, de uma campanha maciça de vacinação. Governadores e prefeitos sensatos e
consequentes estão se mobilizando, costurando um consórcio para adquirir os
imunizantes. É bom. Porque, no que depender da trupe encastelada no Planalto
Central, muita gente vai seguir morrendo porque a deles, no fundo, é a morte.
Mesmo
com os milhões de doses de vacinas que eles anunciam, toda semana, num teatro
patético que já cansou os brasileiros mais esclarecidos...
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