Amanhã acaba o verão. Mais precisamente às 6h38, conforme indica consulta que fiz a um desses sites de previsão do tempo. Passei parte da estação ouvindo, à tarde, um sabiá magistral que se apresentava quando o crepúsculo começava a tingir o céu. Depois dele, vinham as cigarras, quando as cores do dia já tinham esmorecido e, na atmosfera, irradiava-se uma tonalidade azulada, melancólica.
O
outono, que sucede o verão, também é bom: há uma luminosidade divina nos dias
de sol e as temperaturas são mais amenas. É a estação mais chuvosa na Feira de
Santana. Mas reconheço que a trilha sonora do verão – os sabiás e as cigarras –
fará muita falta nesses meses tormentosos que virão aí, à frente. Esses sons acalentavam,
atenuando o efeito do noticiário sombrio que se sucede.
No
céu, umas nuvens escuras – tão típicas aqui da Feira de Santana – despertam
alguma esperança de chuva no dia de São José. Mas é uma esperança vaga, que se
limita à expectativa de um chuvisco, no máximo. Vi, no noticiário, celebrações
que se adaptaram à pandemia, com pouca gente e muito cuidado para impedir a
propagação do novo coronavírus.
Desconverso,
tergiverso, mas sempre recaio na constatação que me abala: é desolador estar no
palco de uma catástrofe sanitária, econômica – humanitária sobretudo – e, o que
é pior, sob um governo absolutamente inepto. Pior ainda: um governo que flerta
e promove a morte com desassombro. Em que o sujeito vai se fiar num momento
desse? Em milagres? O Brasil dos dias atuais atesta os milagres não existem,
por mais que se alardeie isso em programas de tevê.
Quando
se cruza a fronteira entre a civilização e a barbárie depara-se com uma
referência incontornável: a completa incerteza sobre o amanhã. É o que se vê no
Brasil atual. Vá lá que, antes, a barbárie sempre foi a realidade de parte da
população: a pobre, a preta, a parda, a confinada nas favelas e nas periferias,
a que sempre penou sob a selvagem desigualdade brasileira.
Mas
agora a barbárie ganhou impulso e já corteja o que era inimaginável tempos
atrás. Quem não sofria, agora sofre. E quem já sofria, agora sofre dobrado.
Poucos estão ganhando muito com a catástrofe. Lá fora, o Brasil desperta espanto
ímpar. Lembramos muito as trágicas ditaduras africanas da década de 1970. Hoje,
até remotas nações conflagradas são mais civilizadas que o maior país da
América do Sul.
A
sexta-feira escorre com muito silêncio. Nota-se que o feirense ficou mais tenso
com a pandemia catastrófica. Imagino que pense nos hospitais lotados, nas
mortes que vão se avolumando. Seria bom escrever sobre as sextas-feiras
libertárias do passado, que vão ficando cada vez mais distantes.
Mas
é necessário aguardar. E se cuidar para não ser levado pelo Leviatã...
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