Confesso que pensei em escrever a famosa crônica sobre a falta de assunto. Mas devo reconhecer que me falta talento para a empreitada e o pior é que não falta assunto aí na praça. A sordidez no Planalto Central, a indigência intelectual, a truculência, a ignorância, a falta de rumo e de perspectiva, o futuro sombrio, tudo poderia render textos contundentes para entreter quem lê. Isso para não mencionar a pandemia, os aumentos dos combustíveis e dos preços dos alimentos.
Mas
devo admitir que o noticiário político vem provocando asco, até repulsa.
Revolvê-lo, destrinchá-lo, exumá-lo, dá a repugnante sensação de se mexer numa
sarjeta regurgitando dejetos. E ver saltando de lá ratazanas gordas, luzidias,
asquerosas e – sobretudo – agressivas, autoritárias, totalitárias. Então é
melhor deixar a tarefa ingrata para gente com mais estômago. Sobretudo porque
amanhã é sexta-feira.
Lembro
que, em textos anteriores, já mencionei as sextas-feiras libertárias que
anunciam o final de semana. A sensação de leveza vem logo pela manhã, sobretudo
quando é dia de sol. À tarde pulsa mais aquela sensação de liberdade, o reverso
das melancólicas noites de domingo. Mas, com tantas restrições impostas pela
pandemia, reconheço que a própria sexta-feira perdeu parte do seu encanto. O
que continua é a melancolia do domingo à noite. Mas, para escrever sobre ela é
melhor aguardar o próprio domingo à noite.
Como
solução para a falta de assunto, antes, na boca da noite, me animei com o céu
espetacularmente iluminado por relâmpagos. Não ouvi trovões e percebi que a
chuva não ia chegar aqui na Feira de Santana. As nuvens estavam dispersas
demais para uma tempestade. E eu já animado, planejando descrever a trovoada, a
torrente, o reflexo fugaz da iluminação elétrica sobre a água escorrendo
rápida. Mas a chuva não veio.
Que
fazer? Lembrei que amanhã recomeça o toque de recolher, os números da Covid-19
voltaram para patamares alarmantes. Mas também vai cansando repisar o assunto,
lembrar que, pelas ruas, poucos feirenses usam máscaras e muitos julgam que a
pandemia já acabou. Até garimpei uma ideia interessante: por que muitos parecem
desejar o flerte com a morte? Fanatismo? Ignorância? Fastio pela vida? O tema é
fascinante, mas, quando falta inspiração, as palavras ficam pálidas e as ideias,
etéreas.
O
fato é que, arrastando-me, vou me aproximando do epílogo de um texto que, no
fundo, não tem sentido. Nada o fundamenta. Nele não há ordem, nem ideias. Só o
papo vazio, errático, bêbado, de quem queria aproveitar o silêncio e a
inspiração – que não veio – da noite de quinta-feira.
Então,
para arrematá-lo com alguma elegância, é bom desejar um bom final de semana
para quem nos lê!
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