Em
meio aos laranjais em flor, o governo protocolou ontem (20) a famigerada
reforma da Previdência na Câmara dos Deputados. Os financistas aboletados no
Ministério da Economia conseguiram elaborar uma proposta muito mais lesiva aos
interesses dos trabalhadores que o governo anterior, o de Michel Temer
(MDB-SP), o mandatário de Tietê.
Na
ocasião, o polêmico presidente Jair Bolsonaro (PSL-RJ) afirmou que errou ao não
apoiar a reforma quando era deputado, no governo anterior. Alguns ladinos enxergaram
nobreza na afirmação, no reconhecimento de um erro e exultaram.
Prefiro
a interpretação das ruas, sem esses salamaleques dos janotas: espertalhão,
Bolsonaro falou o que a patuleia queria ouvir durante a campanha eleitoral e
criticou a aposentadoria tardia; depois, aplicou uma rasteira sórdida, adotando
a proposta dos entusiastas do “deus mercado”. Manobra digna do mitológico
Macunaíma.
Não
deixa de ser uma versão pouco letrada do “esqueçam o que escrevi”, do
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ou da escrachada “metamorfose
ambulante” de Lula, quando afagava os donos do capital.
O
problema é que os desdobramentos da reforma da Previdência serão muito mais
nocivos no longo prazo que qualquer derrapada dos antecessores. Deu o óbvio: os
pobres, os desafortunados, os desassistidos, os desamparados e os desvalidos
vão se virar com um valor simbólico – uma esmola, no linguajar das ruas – quando
completarem 60 anos.
Os
demais trabalhadores vão precisar se esfalfar durante quatro décadas para
conseguir se aposentar com o valor integral da média das contribuições, a
partir da sexta década de vida. Isso caso consigam. Na prática, pouca gente vai
ter acesso ao benefício. Legiões de velhos paupérrimos vão pontuar a paisagem
urbana nas décadas que se avizinham.
O
tempo mínimo de contribuição sobe para 20 anos. Quem contribuir por período
inferior vai jogar dinheiro fora: não terá direito a nada, mesmo que tenha
contribuído por 19 anos. Uma injustiça absurda que, como sempre, alveja os mais
pobres. Estímulo maior à informalidade não existe.
Os
trabalhadores rurais também não escaparam. Labutando em condições adversas,
expostos às incertezas do clima e das safras, terão que trabalhar até os 60
anos, com no mínimo 20 anos de contribuição. Há, ainda, o traiçoeiro regime de
capitalização, cogitado para atender os interesses dos conglomerados bancários.
Ao largo de tudo, os militares, que escaparam da
reforma. A alegação é que a proposta deles seguirá depois. Pelo jeito, seguirão
lépidos e soltos, aposentando-se aos quarenta e poucos anos...
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