Feira
de Santana tem palmeiras – plantaram-se muitas palmeiras imperiais nas últimas
décadas e, aos poucos, elas vão crescendo, espichando-se, ganhando aquela graça
solene que caracteriza as árvores adultas – e ainda têm sabiás. Pois bem: dia
desses, numa distraída tarde de setembro, flagrei um sabiá numa palmeira na rua
Campina Grande, transversal da avenida Maria Quitéria. Vá lá que a tarde não
era de um azul impecável: havia nuvens que maculavam o entardecer que se
avizinhava; algumas dessas nuvens, a propósito, exibiam aquele tom encardido
das nuvens chuvosas.
Vá
lá, também, que a permanência do sabiá na palmeira foi efêmera: em trânsito,
ele pousou brevemente, com a suavidade habitual. Emitiu um trinado curto –
parecia um apelo aflito – que encontrou o eco de uma resposta mais adiante. Por
um instante ele examinou as cercanias com os olhos pretos, muito vivos. E, pouco
depois, se lançou no ar acinzentado da tarde do inverno que findava, deixando
atrás de si a frustração de quem não o viu cantar para confirmar o consagrado
poema de Gonçalves Dias.
Quem
se dedica a examinar as árvores feirenses às vezes se depara com surpresas
agradáveis. O bem-te-vi pontua a paisagem; o chilrear alegre dos pardais
constitui prazerosa trilha sonora; é sempre possível flagrar o voo azulado das
andorinhas que, agrupando-se a partir da chegada da primavera, fazem o tórrido
verão que se aproxima com o final do ano.
Mais
raro é avistar o beija-flor. Há sempre uma emoção renovada em vê-lo: subitamente
ele surge garimpando flores, com aquele voo singular que combina a graça da ave
com a funcionalidade da máquina; depois do suave contato com a flor – uma
carícia curta que desafia o olho do observador – ele desaparece numa manobra delicada
e estabanada ao mesmo tempo.
Pombos e pardais
Observar
pássaros pela Feira de Santana, porém, vai ficando cada vez mais difícil.
Afinal, construções cinzas surgem todos os dias, revogando mais um pouco o
verde que, noutros tempos, fazia da cidade um pouso agradável para o viajante.
Árvores antigas vão fenecendo – com os maus tratos e o descaso – e não se veem
novas plantas crescendo, lançando a perspectiva de substituí-las lá adiante.
Com
elas, vão-se os pássaros. Mesmo os desprezados pardais, coitados, vão
desaparecendo, apesar de sua impressionante capacidade de conviver com os seres
humanos. Noutros tempos, era muito mais comum o pio alegre dessas aves nas manhãs
feirenses. Vê-las em vadiagem contente, arriscando encantadoras acrobacias,
diminuía a aspereza do cotidiano.
Todas
essas aves vão cedendo espaço aos pombos que se multiplicam com velocidade
impressionante pelo céu da Feira de Santana. No céu, mas também no chão: aonde
se acumulam restos de comida surgem esses animais, destemidos, ousados,
avançando com voracidade sobre qualquer migalha. São tantos que sua presença
sufoca, principalmente no centro da cidade.
Questão ambiental
Datas
festivas costumam ser propícias às celebrações, ao júbilo, às notícias
positivas, como aconteceu com a Feira de Santana em 18 de setembro. Mas é
necessário, também, aproveitar a oportunidade para pensar aspectos da vida da
cidade, à medida que se disponha de espaço para fazê-lo. A questão ambiental é
candente, não só aqui, mas mundo afora.
Por
aqui há o imenso passivo do desmatamento, das áridas vias de circulação sem
arborização, das lagoas que vão desaparecendo ao sabor das invasões tocadas por
gente humilde, mas também por quem dispõe de poder econômico. Não é à toa que
em boa parte do ano – mas, sobretudo, nos meses de verão – o calor se tornou
insuportável, digno das porções mais áridas do planeta.
Apesar de tudo, celebremos,
pois, a Feira de Santana no mês de seu aniversário. Mas mantenhamos a atenção
para os problemas que se avolumam e que exigem intervenções cada vez mais
urgentes. A delicada relação com o meio ambiente – negligenciada desde sempre –
permanece como um desafio, sobretudo para a qualidade de vida e a própria
sobrevivência das gerações vindouras.
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