Originalmente publicado em Out/2020
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Antes eu ‘matava’ seis porcos. Agora só dois e olhe lá. A situação começou a
piorar depois da pandemia. Mas acho que, lá para janeiro, o preço começa a
baixar.
Não,
não há nenhum engano na frase. A demanda por carne suína caiu, mas os preços
dispararam. A lição é de um antigo comerciante ali do Centro de Abastecimento e
das feiras-livres da Feira de Santana. Antes da pandemia, o preço da linguiça
de porco ou da salpresa, a carne suína salgada, estava em R$ 22. Agora, não sai
por menos de R$ 30.
Ele
explica que o produto vem de Minas Gerais. Além de atender mercados Brasil
afora, os fornecedores exportam. E encontraram na China um lucrativo mercado em
2020. É que lá uma doença exigiu o sacrifício de parte do efetivo no começo do
ano. Assim, os chineses foram forçados a importar o produto, inclusive do
Brasil. Como a oferta não se ampliou, os preços explodiram. Pior para quem
compra em real.
Nosso
interlocutor, porém, não domina esses detalhes. Mas conhece o mercado e projeta
que, no começo do ano que vem, os preços tendem a cair. O que o incomoda são as
perspectivas sombrias para o mercado interno. Afinal, o Brasil vai enveredar por
2021 com milhões de desempregados, renda achatada e sem o auxílio emergencial.
Para piorar tudo, a Covid-19 segue na praça.
O
preço da carne-seca – o jabá do nordestino ou a charque do sulista – também
subiu: R$ 33, com expressiva variação nos balcões do Centro de Abastecimento. O
baiano, que gosta de incrementar o feijão com um pedaço de carne salgada, está
penando para manter o hábito. A escalada dos preços, porém, não se limita às
carnes, irradiando-se por boa parte dos alimentos que compõem a cesta básica.
Parte
do problema se deve às condições atípicas de 2020, com essa pandemia que, até
agora, não arrefeceu. Mas a crença pueril nos mecanismos do “deus mercado” e a
bruta incompetência da trupe de Jair Bolsonaro, o “mito”, potencializaram o
desastre. É o caso do arroz: ao abrir mão dos estoques reguladores, o governo
alavancou a abrupta oscilação de preços, penalizando o consumidor. Graças à
ignorância e, claro, à crença cega na badalada “mão invisível” do imortal
economista escocês Adam Smith.
A
turma do Planalto Central – aquela que dispõe de faustosos almoços garantidos –
tem um singelo consolo na ponta da língua: lá na frente, os preços caem. Mas, e
quem não tem poupança e precisa se alimentar aqui e agora? Para esses, provavelmente,
vale a grotesca recomendação do “mito”: “Vá comprar na Venezuela”. Noutras
palavras: o pobre que se exploda, como diria Justo Veríssimo, a personagem do
genial Chico Anysio.
O
brasileiro costuma cultivar a crença de que “tudo se ajeita”. Esse “tudo”,
obviamente, não abarca este governo de destrambelhados. Os dois próximos anos –
aqueles da apoteótica campanha reeleitoral do “mito” – serão duríssimos para o
brasileiro médio, que não conta com político amigo para empregá-lo, nem teve
“mérito” para amealhar fortuna antes da Covid-19.
Mas
tudo pode piorar. É que, mais à frente, querem plebiscito para mudar a
Constituição de 1988. Afinal, segundo a turma do “Centrão”, o brasileiro tem
muito direito e pouco dever...
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