Originalmente publicado em Nov/2020
Neste
Brasil de pouca inteligência e de muita truculência dos últimos tempos, virou
moda candidato derrotado contestar resultado de eleição. A Feira de Santana não
fica atrás: aqui a confraria dos sem-voto chora e range os dentes desde a
eleição municipal passada. O que se vê, Brasil afora, são infundadas suspeitas
sobre as urnas eletrônicas, sobre o sistema de totalização, sobre a lisura do
processo. Os mais anacrônicos querem voto impresso para conferência – ou para controle
dos amigos milicianos – como se faz, por exemplo, no jogo do bicho. Tudo choro
de perdedor.
O
sujeito esfalfa-se distribuindo dezenas de milhares de “santinhos”; desperdiça
litros de saliva catequizando eleitor reticente; gasta fortunas bancando diárias
para panfleteiros, financiando bandeiraços; e o despropósito investindo em
combustível, marmita, água, material de campanha? Muitos enxergam que esse esforço
hercúleo tem que ser, necessariamente, recompensado. De preferência, com
votação consagradora.
Isso
se o eleitor traiçoeiro não enganasse candidato crédulo. E o eleitor baiano,
então, é catedrático em desfaçatez. A solicitude, a cortesia, a simpatia,
muitas vezes, são expedientes para encurtar a conversa e livrar-se da xaropada;
entusiásticas declarações de apoio costumam embutir sádica falsidade; e até a
disciplina simulada de quem se empenha na campanha como cabo eleitoral não
passa de ardil para enganar os postulantes mais ingênuos.
Aqueles
inocentes que aguardavam uma enxurrada de sufrágios – e que ainda estão aí,
imersos na enganosa aclamação das ruas – são burlados nessa azáfama e precisam
esfriar a cabeça, recapitular a campanha, desfazer ilusões. Há algo mais cruel
que aquele otimismo insensato do eleitor? Quando o candidato se vai, tome
comentário jocoso. Que dizer das adesões vibrantes de obscuras lideranças de
bairro? Quando se apura, o sujeito tem só meia-dúzia de votos. Isso quando
tem...
A
situação nem nova é. No remoto outubro de 1958 o cronista Rubem Braga escreveu
um texto primoroso comentando a candidatura de um amigo. O título é “Bilhete a
um candidato”. Nele, o sujeito discorria, otimista, sobre os prováveis 3 mil
votos que o levariam à Câmara Municipal do Rio de Janeiro naquele ano. Pelos seus
cálculos, romperia a marca sem dificuldades. Irônico, Braga admitiu que nem
mesmo ele votou no amigo. Mas deixou um recado consolador, que reproduzo:
“Vou
lhe dizer uma coisa com toda a franqueza: foi melhor assim. Melhor para você.
Essa nossa Câmara Municipal não era mesmo lugar para um sujeito decente como
você! É super desmoralizada. Pense um pouco e me dará razão”.
Leiam
o texto de Rubem Braga disponível na Internet, prezados candidatos, que
ruminam, agora, suas mágoas. Leiam e reflitam sobretudo sobre este parágrafo
derradeiro porque, talvez, ressoe como lenitivo em vossos corações...
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