Pular para o conteúdo principal

A fábrica de versões dos acólitos do “mito”

É comovente a dedicação dos acólitos do “mito” à sua imagem sacralizada. Quando a realidade parece sinalizar para a falência moral do nosso campeão da ética, eis que surge alguma interpretação criativa da realidade para restituir-lhe a aura. Tudo bem que boa parte da matilha digital é composta por robôs. Mas não falta quem se curve, crédulo, a qualquer interpretação e, daí, encarne uma desconcertante ferocidade para difundir a versão e desancar eventuais contestadores.
A mais recente envolveu a “boquinha” mais escandalosa da República – a indicação de um dos filhos do “mito”, pelo próprio, para a Embaixada brasileira em Washington – e induziu reações lastimáveis, constrangedoras até. As matilhas digitais, como sempre, não visaram alvejar os argumentos contrários, mas pulverizar os antagonistas. Por enquanto – felizmente –, só nas mídias sociais.
Foi assim que pacíficas donas-de-casa atestaram, enfáticas, as credenciais do rebento do “mito” para o posto; sisudos microempresários esmiuçaram a lógica das relações exteriores para também referendar a indicação; e muita gente, coitada, que vive garimpando um biscate por aí, acenou com o ingrediente indispensável para o posto: a “confiança” de quem indica.
O problema é que, mal a trupe se refazia do tranco, mais uma novidade veio à boca da cena: Dias Toffoli, ministro do Supremo Tribunal Federal, providenciou a suspensão da investigação contra outro filho do “mito”, o do laranjal. De quebra, todas as demais investigações relacionadas à lavagem de dinheiro, do mesmo gênero, foram suspensas até decisão definitiva do STF.
Quem reivindicava impeachment para Dias Toffoli há menos de um mês, dessa vez engoliu calado. Falta do que argumentar? Que nada! Nenhum acólito ousa esconjurar qualquer rebento do “mito”. Desta vez, ninguém leu as tradicionais vituperações contra o ministro – ex-advogado do petê – que sempre esteve entre os alvos prediletos. O silêncio cúmplice reverbera, ensurdecedor.
É essencial muita fé no “mito” para sustentar esse diapasão por muito tempo. Afinal, o que não faltam são furdunços, quase diários. Mas a fé alimenta. Para entusiasmar, há outros “mitos” no panteão do Planalto. Sérgio Moro – o ministro da memória curta – está aí para atestar. Pilhado num impressionante volume de mensagens comprometedoras, nega tudo, embora ressalte que não se lembra de nada. E todos acreditam, compungidos.
Sob a batuta de Paulo Guedes – aquele que foi chamado de “Tchutchuca” – a economia anda de lado, mas não falta criatividade para justificar. O mais trivial é culpar as gestões petistas pela inação no presente; o mais desconcertante é a proliferação de oráculos que profetizam, convictos, que a atividade econômica está em franca retomada. Na média, projetam o paraíso para o Brasil liberal que os privatistas extrairão da cartola.
Apesar de todas as tragédias, não deixa de ser divertido aguardar as versões dos robôs – conotativos e denotativos – sobre o antepenúltimo escândalo da República Bananeira...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada fei...

Patrimônio Cultural de Feira de Santana I

A Sede da Prefeitura Municipal A história do prédio da Prefeitura Municipal de Feira de Santana começou há 129 anos, em 1880. Naquela oportunidade, a Câmara Municipal adquiriu o imóvel para sediar o Executivo, que não dispunha de instalações adequadas. Hoje talvez cause estranheza a iniciativa partir do Legislativo, mas é que naqueles anos os vereadores acumulavam o papel reservado aos atuais prefeitos. Em 1906 o município crescia e o prédio de então já não atendia às necessidades do Executivo. Foi, então, adquirido um outro imóvel utilizado como anexo da prefeitura. Passaram-se 14 anos e veio a iniciativa de se construir um prédio único e que abrigasse com comodidade a administração municipal. Após a autorização da construção da nova sede em 1920, o intendente Bernardino Bahia lançou a pedra fundamental em 1921. O engenheiro Acciolly Ferreira da Silva assumiu a responsabilidade técnica. No início do século XX Feira de Santana experimentou uma robusta expansão urbana. Além do prédio da...

Placas de inauguração contam parte da História do MAP

  Aprendi que a História pode ser contada sob diversas perspectivas. Uma delas, particularmente, desperta minha atenção. É a da Administração Pública. Mais ainda: a dos prédios públicos – sejam eles quais forem – espalhados por aí, Brasil afora. As placas de inauguração, de reinauguração, comemorativas – enfim, todas elas – ajudam a entender os vaivéns dos governos e do próprio País. Sempre que as vejo, me aproximo, leio-as, conectando-me com fragmentos da História, – oficial, vá lá – mas ricos em detalhes para quem busca visualizar em perspectiva. Na manhã do sábado passado caíram chuvas intermitentes sobre a Feira de Santana. Circulando pelo centro da cidade, resolvi esperar a garoa se dispersar no Mercado de Arte Popular, o MAP. Muita gente fazia o mesmo. Lá havia os cheiros habituais – da maniçoba e do sarapatel, dos livros e cordeis, do couro das sandálias e apetrechos sertanejos – mas o que me chamou a atenção, naquele dia, foram quatro placas. Três delas solenes, bem antig...