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Rearmamento sofre revés temporário


- ...Vou aproveitar e comprar logo, porque vão proibir lá adiante.
Essa frase eu ouvi num ônibus em São Paulo, no início de janeiro. Foi quando Jair Bolsonaro (PSL-RJ), o mandatário do Vale do Ribeira, anunciou a liberação da posse de armas. O sujeito, ao telefone, estava entusiasmado: migrante nordestino, pretendia comprar uma arma também para defender sua propriedade num remoto rincão no espinhoso sertão pernambucano. Além, claro, do trabuco que pretendia manter em sua casa na periferia remota da capital paulista.
Meses antes, aqui na Feira de Santana mesmo, ouvi um sujeito planejando comprar “uma ponto quarenta” para emoldurar sua cintura. Isso foi logo depois da eleição que sacramentou a ascensão da extrema-direita ao poder no Brasil. E outro dia um magote de malandros, numa esquina feirense, trajando roupas puídas, debatia a hipótese de circular com uma “ponto quarenta” pelas ruas.
Só que ontem (18) Jair Bolsonaro sofreu um primeiro revés no Senado: os decretos que flexibilizavam o porte de armas – eufemismo para rearmamento – foi derrubado pelo Legislativo. Falta, ainda, a apreciação dos deputados. Tudo indica, porém, que tende a ser rejeitado. Objetivamente, é a única proposta apresentada pela extrema-direita nas eleições presidenciais.
Mas, justiça seja feita: as bancadas da bíblia, da bala e do boi discordam da forma, não do conteúdo da proposta. Opinam que Jair Bolsonaro não pode revogar o Estatuto do Desarmamento por decreto. E já tramam a tramitação de propostas com teor similar. A formalização das milícias rurais e o impulso à indústria armamentista já estava no radar dessa gente há muito tempo.
As excelências contam com carros blindados, residências fortificadas e exércitos de capangas para defendê-los: serão, portanto, pouco afetados pelo morticínio que se desenha para o futuro. O cidadão comum – sobretudo o afrodescendente pobre residente nas periferias – é quem vai figurar na alça de mira.
Desavenças por causa de som alto, briga de crianças, altercação de futebol, ciúmes, bebedeira e rixas pessoais serão novamente resolvidas à bala. Com a diferença que, ao contrário do passado, as ocorrências serão muito mais corriqueiras.
- Todo cidadão deve ter direito a uma arma para se defender!
Quem esgrime argumentos do gênero delineia bem – às avessas – o dramático pano de fundo da questão. Sinaliza que o Estado, mesmo gastando fortunas com o aparato policial, faliu e não pode garantir um mínimo de segurança ao cidadão. Indica também que o poderoso lobby da indústria bélica prevalece. Para prejuízo de toda a sociedade brasileira.
É funesto o futuro que se desenha para o País. E, quem sobreviver, verá.

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