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A Feira e os seus jovens



               
            
A folia momesca costuma ser associada à juventude. Não é para menos: as danças, as bebidas e os elevados decibéis são ingredientes que encantam e fazem a cabeça dos mais jovens. Festas como a Micareta quase sempre são representadas por jovens sorridentes, extravasando alegria e contentamento, vivendo a vida com pleno apetite. Em 2013 a Micareta de Feira de Santana também foi assim, apesar da trajetória declinante da festa nos últimos anos, perdendo espaço para as inúmeras festas similares que acontecem em diversas regiões do Brasil. Os próprios feirenses gostam de viajar em busca de sossego no período.
                A juventude feirense não esteve presente apenas nos badalados camarotes que fazem a alegria dos mais abastados. Também não se restringiu aos frenéticos blocos puxados pelas estrelas da música baiana. Tampouco se limitou à presença nos trios ou ao longo do circuito, acotovelando-se nos limitados espaços reservados ao desprestigiado folião-pipoca.
                Muitos jovens feirenses foram vistos trabalhando: jovens sorridentes, talvez de classe média, recepcionando foliões ilustres nos camarotes; jovens da periferia puxando as cordas que asseguram a exclusividade dos blocos; outros vendendo churrasco, cerveja em lata, refrigerante, pipoca, algodão-doce ou os bibelôs que fazem a alegria da criançada nos quatro dias de Micareta.
                Também foi possível encontrar jovens organizados em gangues que trocam socos com rivais ou desafetos no asfalto pegajoso da avenida Presidente Dutra. Muitos foram parar atrás das grades, atravessando madrugadas intranquilas nos xadrezes úmidos e sombrios do Complexo Policial Investigador Bandeira. Alguns, depois da festa, seguiram sob escolta para o Conjunto Penal de Feira de Santana, pois eram procurados pela Justiça ou cometeram crimes mais graves.
                Jovens
                A Feira de Santana é uma cidade jovem: nada menos que 50,2 mil pessoas no município tem idade entre 15 e 19 anos. Quando se considera o universo entre 15 e 29 anos – aquela fase delicada da vida em que se vive a transição dos estudos para o mundo do trabalho – o IBGE cravou 162,5 mil jovens no Censo realizado em 2010. Existe, portanto, uma efervescência juvenil que necessita de espaço para crescer na vida.
                Lamentavelmente, 26,4% dos jovens entre 15 e 19 anos não estudam. Isso numa fase em que é natural estar na escola ou na faculdade. O drama, porém, é maior: 10,8% não estudam, não trabalham e também não procuram trabalho, de acordo com o IBGE. Estão, portanto, mais suscetíveis à criminalidade e ao uso de drogas.
                O problema não para por aí. Quando se considera o conjunto dos jovens com idade entre 15 e 29 anos, o número sobe ainda mais: 19,2% estão nessa situação, totalmente inativos. São mães precoces que se resignam à condição de donas-de-casa; são jovens que abandonaram a escola precocemente e que, agora, vagam sem estudo e sem trabalho. Numericamente, representam mais gente que 337 municípios baianos: 31,1 mil pessoas.
                Alternativas
                Muito se fala dos jovens nos períodos eleitorais. Aliás, os programas mais emocionantes do horário eleitoral costumam ser emoldurados com sorrisos juvenis. Fala-se do futuro e das perspectivas promissoras que se colocam. Vendem-se sonhos. Depois que o último voto é contabilizado e o resultado da eleição é oficialmente proclamado, retoma-se a amnésia costumeira.
                Feira de Santana costuma ser muito cruel com seus jovens. Todos os anos, pelo menos uma centena deles é assassinada. Muitos enveredam para a criminalidade e, depois de presos, veem parte de sua juventude se perder nos cárceres imundos e fétidos. Outros – talvez os menos afortunados – perambulam feito zumbis, escravizados pelas drogas, à espera do tiro de misericórdia.
                Na Bahia e no Brasil, jovem afrodescendente e pobre só vira notícia quando vai preso. Na Feira de Santana não é diferente. Seria bom que, passada a Micareta e iniciado o ano, o município se mobilizasse para discutir alternativas para os seus jovens, sobretudo esses 31,1 mil que não estudam, não trabalham e – sabe Deus o porquê – vivem inteiramente inativos. A partir daí, talvez começássemos a mudar o deplorável estigma subliminar do noticiário.
               

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