Infelizmente não conheci
Juarez Bahia. Quando comecei a labutar na imprensa feirense, em meados dos anos
1990, no extinto jornal Feira Hoje, o reconhecido jornalista já não residia na
cidade havia décadas. Ele faleceu pouco tempo depois, em janeiro de 1998. Lá se
vão mais de 20 anos e, pelo que se percebe, não houve a preocupação de homenagear
a um dos mais importantes profissionais da imprensa surgidos aqui na Feira de
Santana.
Juarez Bahia nasceu na
vizinha Cachoeira, palco pujante da cultura baiana e berço de muita gente
célebre. Foi em 18 de outubro de 1930. Pesquisando pela internet, descubro que,
ainda criança, depois de uma primeira temporada em Santos-SP, Juarez Bahia
retornou à Bahia e à Feira de Santana. Aqui começou a trabalhar com o advogado
Arnold Ferreira da Silva. Aos 15 anos já atuava como jornalista na “Folha do
Norte”, mais longevo jornal da cidade.
Lá adiante, decidiu
tentar a sorte novamente em Santos: foi estivador no porto, tipógrafo na
“Tribuna de Santos” e, tempos depois, engrenou no jornalismo por lá também, na
redação de “A Tribuna”. Estudou Comunicação na faculdade que foi embrião da
Universidade Católica de Santos tornando-se, posteriormente, professor da própria
instituição.
Na década de 1960 já se
tornava teórico do jornalismo, lançando “Três fases da imprensa brasileira”,
“Jornal, História e Técnica” e, por fim, “Jornalismo, Informação e Comunicação”.
Em 1964, se tornou uma das vítimas do golpe militar, sendo detido pela
repressão durante nove dias. Pouco depois ganhou a liberdade e voltou à
imprensa de Santos.
À época, já era
considerado um dos principais jornalistas da região, ocupando posição de
destaque em publicações locais. Juarez Bahia era visto como um profissional
audacioso, que adotou ousadas inovações editoriais. Em Santos, tornou-se
reconhecido por revelar os jovens talentos jornalísticos egressos da faculdade
local.
Mas a cidade praiana se
tornou pequena para Juarez Bahia: nos anos seguintes, começou a atuar em órgãos
como “O Estado de São Paulo”, “Folha de São Paulo” e “Jornal do Brasil”. Redigiu
editoriais – atribuição das mais nobres numa redação – e atuou correspondente
em Portugal e na África. Morreu em 1998, de embolia pulmonar, com apenas 67
anos. Ao longo dessa trajetória, se tornou também um reconhecido jornalista de
política.
“Setembro
na Feira”
A distância da Feira de
Santana não impediu Juarez Bahia de lançar um dos principais romances
ambientados no município: “Setembro na Feira”, obra lançada em 1986 e que traz nítidos
traços autobiográficos. Na obra, o autor desnuda a Feira de Santana da década
de 1940, época dos grandes avanços rodoviários, o que incluiu a inauguração da
BR 116, a mítica Rio-Bahia.
O romance traz, também,
uma bucólica visão da Queimadinha, o bairro aonde o escritor morou. Seu vivo
talento literário leva o leitor feirense a imaginar aquelas cercanias
desabitadas, pontuadas pelas lagoas e olhos d’água, com a vegetação pujante
limitando a cidade. Estradas empoeiradas, sem pavimentação – hoje artérias
urbanas asfaltadas, caóticas com o ir e vir dos automóveis –, ligavam a distante
Queimadinha e a população pacata ao Campo do Gado de então, ao acanhado centro
da cidade.
Aquela Feira de Santana
de Juarez Bahia era uma cidade tipicamente interiorana: as intermináveis
conversas masculinas que se estendiam noite afora nas quitandas da Queimadinha,
o céu vívido de estrelas que ofuscavam a parca iluminação elétrica, o peso da
religião ditando os costumes, a pobreza periférica de quem vivia apartando do circuito
pujante dos comerciantes e pecuaristas.
O autor é feliz também
no contundente retrato da elite feirense, aristocrática e rural. Sobretudo em
relação aos coronéis, senhores da vida local – na economia, na política, nos
costumes – e objeto do ambíguo sentimento que mesclava o amor, ódio e, principalmente,
o temor. Essas personagens são o que há de mais desconcertante em “Setembro na
Feira”.
São marcantes os traços
biográficos de Juarez Bahia. Quem lê o romance observa-o ali, se movimentando,
examinando os ambientes com o olhar do repórter precoce, fixando as
personalidades e o teatro da vida feirense que se desnuda aos olhos de
adolescente acanhado.
Juarez Bahia era
negro, de origem modesta e jovem quando deixou a Feira de Santana em busca de
melhores condições de vida lá em São Paulo. Evoluiu profissionalmente, galgou
posições de destaque na imprensa brasileira, mas jamais esqueceu a cidade aonde
deu os primeiros passos em sua trajetória profissional. É o que “Setembro na
Feira” demonstra. Sendo assim, o autor merecia mais lembranças e homenagens que
perenizassem sua contribuição ao jornalismo.
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