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Crônica tirada de uma propaganda de jornal

A preservação da História e o aprendizado que dela se pode extrair são fatores que contribuem para o desenvolvimento de um país, de uma região ou até de uma localidade. No Brasil, felizmente, temos despertado nos últimos anos para a importância da conservação da nossa História em suas múltiplas dimensões. Mesmo em Feira de Santana, que tem se notabilizado pela demolição de imóveis antigos para dar lugar a estacionamentos rotativos, há iniciativas ainda isoladas dignas de elogios.
Uma delas, recente, partiu da Fundação Senhor dos Passos de lançou uma publicação reunindo exemplares de jornais que circularam em Feira de Santana entre os anos de 1877 e 1888.
Assim, os feirenses dos dias atuais podem saber o que ocorria na cidade lá pelo final do século XIX através das páginas de publicações como “O Progresso”, “O Motor”, “Echo Feirense”, “Cidade da Feira” ou “O Vigilante”, para citar apenas algumas publicações.
No Brasil de pouca leitura, muitos pensam que conhecer o passado é uma atividade ociosa que em nada contribui para o presente ou o futuro. Graças a raciocínios do gênero e ao desconhecimento do passado que estamos, ainda hoje, patinando com problemas que há muito poderiam ter sido resolvidos. Folheando os jornais feirenses do século XX, por exemplo, enxergamos dificuldades que ainda hoje persistem e desafiam a sociedade.
Armazém
Um deles, comum ao interior do Nordeste e presente aqui na Feira de Santana, nota-se até na singela publicidade do grande armazém de José Edmundo de Araújo, comerciante estabelecido no Largo do Senhor dos Passos, 37, e que utilizou as páginas de “O Progresso” de 22 de setembro de 1882 para divulgar seu estabelecimento.
Nele, era possível encontrar “todo e qualquer gênero de molhados e miudezas”. O destaque ficava para os produtos mais sofisticados, como “queijos flamengos e de prato”, manteigas como a “afamada de Petersem”, lingüiças finas e sardinhas sem espinha.
Mas os gêneros mais badalados certamente eram as ostras, os lagostins, as ameixas secas e em calda, as uvas moscatéis em conserva, os biscoitos alemães e ingleses, molho inglês, vinhos especiais como o do Porto, além de produtos como papel inglês, champagne, vermute, conhaque e até “sabonete inglez verdadeiro”, conforme a grafia da época. O armazém de José Edmundo de Araújo provavelmente correspondia naqueles anos a um shopping center dos dias atuais.
Valor
Essa singela publicidade mostra mais que o gosto do feirense abastado por produtos sofisticados, preferencialmente importados da Europa. Mostra que, desde aquela época e até os dias atuais, se agrega pouco valor ao que é produzido aqui, havendo sempre a necessidade de adquirir produtos mais elaborados em outras partes. No século XIX compravam-se manufaturados e artigos sofisticados na Europa. Com a industrialização do Sudeste, hoje compramos em São Paulo.
Com certeza a farinha de mandioca, o feijão, o milho e o fumo produzidos na Feira de Santana faziam pouco sucesso entre os clientes do armazém de José Edmundo de Araújo. Mas essa era a base agrícola do município e, passado mais de um século, pouca coisa mudou.
A retrospectiva histórica, portanto, é um elemento valioso. É o conhecimento do passado que nos permite formular as perguntas mais adequadas no presente. Por que a região de Feira de Santana não desenvolveu sua agroindústria? E quais os desafios para que o faça nos dias de hoje? Respostas do gênero exigem o suporte da História...

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