“FEIRA DE
SANTANA (Do Correspondente) Reina grande animação nesta cidade em torno dos
festejos tradicionais da Micareta, que este ano promete bater record. O povo da
‘Princesa do Sertão’, esquecendo por instantes as dificuldades e a crise
reinantes não só no Município com em
todo o país, está fazendo um sacrifício para manter com brilho e alegria a sua
maior festa popular, a sua afamada e querida Micareta”.
Não, o texto
não é o ensaio de nenhum escriba sobre a Micareta feirense que se avizinha. Tampouco
é coisa de algum renitente adversário dos mandatários políticos de plantão. É
coisa antiga, de quando a Micareta apenas engatinhava: o texto está na página 2
do jornal “O Momento”, de 24 de março de 1948. Está em vias de completar 72
anos e foi publicada com título chamativo: “Animada a Micareta em Feira de
Santana”.
Adiante, a
notícia é mais objetiva. Nela, emergem os nomes dos responsáveis por aqueles
primeiros anos da folia juvenil: “A Comissão promotora dos festejos nesta
cidade está composta dos srs. Oscar Erudilho, Carlos Marques, Gilberto Costa,
Florisval Albuquerque, além de outros, que têm desenvolvido grande atividade em
prol do maior brilhantismo dos 3 dias da grande folia”.
Naquela
época a festa era mais espontânea. E mobilizava muito mais os feirenses, pelo
que se percebe: “O que atesta também a animação reinante em Feira de Santana é
o grande número de músicas de compositores locais, irradiadas todos os dias das
21 às 22 horas, pelo Serviço de Telefonia de Feira”. Será que havia um serviço
de alto-falantes divulgando as canções? A matéria não esclarece.
Quem eram
esses compositores? O anônimo correspondente de “O Momento” detalha mais
adiante: “Os compositores locais Pedro Matos, Humberto de Alencar, Carlos
Marques, etc., destacam-se pelo sucesso de suas marchinhas e sambas”.
Carlos
Marques – quem terá sido? –, pelo visto, destacou-se mais naquele longínquo
1948. O texto explica, mais adiante: “Entre estas destaca-se a marcha ‘Que
agonia’, de Carlos Marques, que traduz a revolta do povo pela constante falta
de luz”.
Naqueles
dias ocorreu uma irreverente manifestação estudantil, que percorreu as ruas da
cidade com velas acesas, protestando contra as constantes quedas de energia
elétrica. A iniciativa não se restringiu aos estudantes e contou com ampla
adesão da população.
“O Momento”
era jornal engajado, editado em Salvador, mas com correspondentes espalhados
pelo interior baiano. Vinculado ao então Partido Comunista Brasileiro – o
pecebê – batia sem piedade nos poderosos de plantão. E, claro, cortejava seus
lideres, a exemplo do mitológico ex-capitão do Exército Luís Carlos Prestes.
É profunda a
ironia que se pode extrair de uma simples notícia de jornal: o primeiro parágrafo,
em linhas gerais, traduz parte do que o feirense de hoje vive, oprimido pela
voraz crise econômica e pelo “pibinho” recente, assustado com a epidemia do
coronavírus, mas na expectativa da Micareta que se avizinha em abril.
Ou não, porque o coronavírus avança e, ao que
tudo indica, a folia terá que ser adiada.
Comentários
Postar um comentário