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O salto no escuro

Faltam, precisamente, 85 dias para as eleições presidenciais no Brasil. Desde a redemocratização que o País não vive sob tanta confusão política. Líder nas pesquisas, o ex-presidente Lula (PT) permanece preso em Curitiba: tudo indica que não vai concorrer. O segundo colocado, Jair Bolsonaro (PSL), investe em uma alarmante retórica beligerante. Segundo a análise convencional, ambos se situam nos extremos ideológicos, à esquerda e à direta, respectivamente.
Para o bem do Brasil – alega-se – é necessário trilhar o “caminho do meio”, escolhendo um candidato mais alinhado com o suposto “centro” ideológico. Essa faixa está congestionada: Marina Silva (Rede), Álvaro Dias (Podemos), Geraldo Alckmin (Podemos), Henrique Meirelles (MDB) e vários nanicos acotovelam-se, apesar de repisarem a necessidade de união e convergência.
Flutuando, Ciro Gomes (PDT) empenha-se para atrair o “Centrão” – aqueles empedernidos governistas, entusiastas do balcão, ex-liderados pelo atual presidiário Eduardo Cunha (MDB-RJ) – para se viabilizar como alternativa. Ironicamente, sofre implacável torpedeamento tanto de Michel Temer (MDB), o mandatário de Tietê, quanto do próprio PT, que deseja preservar seu trânsito junto ao eleitorado do Nordeste.
Em suma, o cenário é de amplas incertezas. Se fosse há um ano, talvez pudesse ser visto como natural, sobretudo em decorrência do traumático impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016. Mas não a 85 dias das eleições – repita-se – num País fraturado por inéditas divisões políticas. Há até quem defenda uma delirante “intervenção militar”. Na prática, um golpe de Estado.
Projeto
Apesar do leque de pré-candidaturas, o que menos se enxerga é proposta até aqui. O que se propõe para estancar o crônico rombo fiscal, que precisa ser contido? Ninguém diz nada. Pelo menos nada que vá além das platitudes, dos discursos adocicados, das promessas vãs. Como vai se superar a crise econômica, que se arrasta, infindável? O silêncio sobre o tema é constrangedor.
Até fevereiro a reforma da Previdência era o tema da vez. Foi rifada e, hoje, não se fala mais nela. Mas é evidente que segue necessária. Só que, até aqui, nenhum pré-candidato se habilitou a pisar nesse terreno pantanoso. Péssimo sinal para o trabalhador, que vai arcar com o ônus lá adiante, depois de eleger um candidato no escuro.
O único tema é a segurança pública. Pior: o debate se restringe à liberação ou não do porte de arma. Muitos estão entusiasmados com a ideia, sobretudo a indústria do setor. O debate traz um detalhe sutil: liberar o porte implica na renúncia do Estado em oferecer segurança pública. Quem quiser que compre sua arma e saia por aí trocando tiros, porque os compromissos não vão além disto.
Não faz muito tempo, escrevi um texto com teor semelhante. A insistência se deve ao fato de que nada mudou. As eleições estão cada vez mais próximas e ninguém vê o debate – que inclusive não acontece – se qualificando. É sinal de que o País se prepara para mais um salto no escuro.
É preciso ir se preparando para o pior. 

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