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Após chacinas, tensão dominou a segunda-feira

A noite foi tensa ontem (18) na Feira de Santana. Aquele foguetório que acompanha as celebrações juninas não se ouviu, contrastando com as noites anteriores. Foi reduzido e espaçado o espocar dos fogos, que deixaram de iluminar o céu feirense. Luz, mesmo, só a do holofote do helicóptero da Polícia Militar, que sobrevoou a cidade durante parte da noite, sob o teto avermelhado do céu com nuvens carregadas, baixas.
Na Queimadinha, a aeronave sobrevoou três vezes aquela conturbada região em que se veem resquícios de lagoa e a densa vegetação de taboas. Do alto, lançava fachos de luz sobre as vielas. Embaixo e nas cercanias, reinava um silêncio denso, incomum nessa época do ano. A quietude tornava ainda mais monótona a luz das lâmpadas de iluminação pública, que feriam fragilmente a penumbra citadina, sob a cortina d’água.
Pela cidade também se viu a circulação mais intensa de viaturas, com os giroflexes ligados, projetando luzes vermelhas e azuis sobre o asfalto umedecido pela chuva. Desde o início da noite predominou um frio suave, mas não foi ele que espantou os transeuntes. Pouca gente também se dispôs a acender as tradicionais fogueiras que caracterizam o período.
Todo esse clima decorreu dos 18 assassinatos registrados no fim de semana – inclusive de um policial militar, o primeiro da série –, o mais violento já registrado na Feira de Santana. Aliás, desde o fim de semana que mais viaturas circulam e o helicóptero corta os ares feirenses, mas nada disso impediu a matança: os assassinos seguiram apertando o gatilho com desenvoltura, alheios ao reforço policial.

Centro da Cidade

O dia também foi tenso, inclusive no centro da cidade. Nele, até a Copa do Mundo perdeu protagonismo no papo de comerciários, camelôs e ambulantes: discretamente – alguns lançando olhares cautelosos – comentavam a chacina do final de semana. Mas havia também um silêncio maior que o habitual: sociedade nenhuma enfrenta um trauma desses sem sequelas, mesmo a Feira de Santana brutalizada pela violência endêmica.
Quem exterminou tanta gente num intervalo tão curto? As hipóteses são ainda mais inquietantes que a tragédia em si. Especulações divulgadas pela imprensa mencionavam grupos de extermínio, que teriam se vingado da morte do policial militar. Mas autoridades cogitam que as facções se aproveitaram do momento e saíram ajustando contas, eliminando desafetos, investindo na instabilidade.
Ambas as hipóteses sinalizam para a alarmante situação da Segurança Pública. Será que exterminadores saíram eliminando gente a torto e a direito, cobrando uma suposta vingança? Ou facções criminosas, num arroubo de ousadia, decidiram apertar o gatilho apostando na impunidade? Qualquer das hipóteses – é necessário ressaltar – aponta para uma situação que bordeja uma guerra civil. Mas apenas as investigações podem elucidar a matança.
Ontem, apesar de todo o aparato mobilizado, houve mais um assassinato: um jovem – assim como todos os mortos do fim de semana – foi executado na porta de casa, no bairro Papagaio. Será que, em outras partes do mundo houve tanta violência, mesmo nos países em guerra, no intervalo desse fim de semana? No Brasil, talvez. Mundo afora, é difícil. Mesmo – ressalte-se – em ambientes com conflito bélico declarado.

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