Quem
encara a função de cronista nesses tempos funestos tem que consultar os sites
noticiosos o tempo todo. É que, a cada momento, pode vir à tona uma barbaridade
nova, um absurdo ímpar, um delírio singular. O primeiro impulso costuma ser tentar rebater
a atrocidade da vez. Só que o esforço é inútil, pois elas se avolumam numa
torrente impressionante. Portanto, é necessário critério para selecionar o
absurdo do dia e esmiuçá-lo. Evitando, é claro, enveredar por polêmicas
estéreis que só interessam os governantes que estão aí de plantão e que não tem
nada para mostrar.
Na
véspera do Dia do Trabalho, a profusão de sandices foi imensa. Trafegou da
crise venezuelana – que pilhou a alta cúpula do governo desinformada – e
alcançou o corte arbitrário de verbas para universidades públicas, incluindo aí
a Universidade Federal da Bahia, a Ufba. Isso para não mencionar a repercussão de
mais uma interferência na gestão do Banco do Brasil ou a anuência para apertar
o gatilho que se pretende conceder aos ruralistas.
-
Se fala em 12 milhões de desempregados. Sim, eu acho que é muito mais que isso
– afirmou ontem Jair Bolsonaro, o polêmico mandatário do Vale do Ribeira, que,
mais uma vez, resolveu contestar o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, o IBGE. A declaração veio no tom habitual, de quem,
despreocupadamente, comenta uma partida de futebol da arquibancada.
Sobre
o mais importante ele não falou: qual a solução para o desemprego? Isso ficou a
cargo do “czar” da economia, Paulo Guedes, o farol liberal desses tempos de
profana exaltação ao “deus mercado”. O oráculo disse:
-
Estamos pensando em tributar um espaço novo (...). De repente, você vai gerar 2,
3, 4 ou 5 milhões de empregos no espaço de um ano, um ano e meio.
O
“espaço novo” em questão é extinguir impostos para empresas e repassar o ônus
para as transações bancárias, com alíquota de 0,9%. Uma espécie de CPMF mais
vitaminada. Ninguém comentou, mas aqueles que se esfalfam e recebem uma miséria
vão entrar com seu quinhão de sacrifício nisso também. É medida digna de um
Robin Hood às avessas: vai tirar dos pobres para entregar aos ricos.
Os
“cinco milhões” de empregos é enredo de samba velho: quando a revogação de boa
parte da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi aprovada, Michel Temer e
sua trupe prometiam dois milhões de empregos.
O tempo passou e aquilo que todo mundo desconfiava se confirmou: não
passou de empulhação para enganar crédulos e desavisados. Com sua contabilidade
de balcão de padaria, os governantes de plantão tentam repetir a manobra.
Seria
bom escrever a crônica do 1º de Maio sinalizando para um futuro mais promissor
para o trabalhador. Infelizmente, não vai ser assim. Pelo que se vê, de
retrocesso em retrocesso o trabalhador médio vai, aos poucos, caminhando para
ficar aquém até do nível mais elementar de subsistência.
Pagar
a água e a luz, a condução para o trabalho, o modesto plano de saúde, o aluguel,
vai ficar difícil. Confortos como a TV a cabo ou a viagem de férias a prestação
se tornarão lembranças distantes. Se brincar, para muita gente, até o ato
elementar de se alimentar estará ameaçado.
Sobre
isso, justiça seja feita: desde sempre os governantes que estão aí prometem
mais emprego com menos direitos. Pelo jeito, vão ficar devendo a parte do
emprego. Mas ninguém vai poder reclamar que foi enganado, porque o roteiro
desse governo estava esboçado desde sempre.
O fato é que este é o mais
funesto 1º de Maio em muitas décadas. É momento para refletir. E começar a se
mexer para resistir, coletivamente, à ofensiva.
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