Pular para o conteúdo principal

Quando as imagens disparam o gatilho das metáforas

 

As fotografias acima são flagrantes do competente repórter fotográfico Luiz Tito. Algo que me encanta desde que comecei no jornalismo – isso faz tempo – é o fato das fotografias, em muitos casos, dispensarem textos, legendas, explicações. Nestas situações, elas comunicam por si mesmas, tornando as palavras dispensáveis. Mas algumas delas vão muito além. São capazes de produzir mais metáforas que milhares de palavras aglomeradas num texto qualquer.

É o caso das fotos que ilustram este texto. O flagrante foi captado pouco antes da chegada de Jair Bolsonaro, o “mito”, à BR 101, em Conceição do Jacuípe, para inauguração de um trecho duplicado da rodovia. Como quem acompanha o noticiário político sabe, o ato foi hoje (26) pela manhã.

Está lá a bandeira brasileira burocraticamente esticada, na curva do caminho; ali perto, só o cãozinho vira-lata que se coça, ignorando o símbolo pátrio; depois ele avança, indiferente, abandonando o cenário, sem sequer lançar um olhar à bandeira esquecida; resta a desolação de ver o pavilhão do outrora país do futuro solitário num cotovelo de estrada; a uns poucos metros, a mureta metálica, frágil demais para evitar que o País despenque na ribanceira próxima.

Esta é apenas uma das metáforas que cabem na fotografia. O Brasil arrastando sua síndrome de vira-lata, o caminho tortuoso, difícil, o patriotismo retórico, vazio, sem conteúdo, tudo também cabe como metáfora a partir destas fotografias.

A visita do “mito” à Feira de Santana reforçou a metáfora que o flagrante fotográfico captou. Cercado pela claque habitual, Jair Bolsonaro arrotou uma valentia que já soa repetitiva, monótona: militares na rua para acabar com o isolamento social, forçar o brasileiro a retomar a rotina, expondo-se à Covid-19 e à morte.

Depois, bravateou: “Nossa bandeira não será vermelha, jamais”. Não mencionou outras colorações possíveis: o preto do luto por tantos mortos na pandemia, nem o laranja das rachadinhas.

Depois de destratar uma repórter – seu desequilíbrio vem se amiudando; há quem fareje pânico em relação à CPI da Pandemia – sobrevoou a Feira de Santana e talvez tenha exultado com a cidade quase sem vegetação ou áreas verdes. Por fim, desfilou lá em seu habitat: o 35º BI, quartel do Exército na cidade.

Além de atiçar a claque, o “mito” pouco falou. Não mencionou obras ou recursos para a Feira de Santana. Até a renovação da promessa de duplicação do Anel de Contorno ficou a cargo do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas. Como sempre, não se mencionaram valores, nem prazos concretos.

O Brasil de Jair Bolsonaro, o “mito”, no entanto, é isso que se exibiu na Feira de Santana. Muito oba-oba, muito patriotismo de fachada, muita truculência, muita valentia da boca para fora, mas, de construtivo, nada.

Resta torcer para que este pesadelo acabe em 2022. Porque senão, quem vai acabar de vez a partir de 2023 é o Brasil...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Parlamento não digere a democracia virtual

A tentativa do Congresso Nacional de cercear a liberdade de opinião através da Internet é ao mesmo tempo preocupante e alvissareira. Preocupante por motivos óbvios: trata-se de mais uma ingerência – ou tentativa – da classe política de cercear a liberdade de opinião que a Constituição de 1988 prevê e que, até recentemente, era exercida apenas pelos poucos “privilegiados” que tinham acesso aos meios de comunicação convencionais, como jornais impressos, emissoras de rádio e televisão. Por outro lado, é alvissareira por dois motivos: primeiro porque o acesso e o uso da Internet como meio de comunicação no Brasil vem se difundindo, alcançando dezenas de milhões de brasileiros que integram o universo de “incluídos digitais”. Segundo, porque a expansão já causa imensa preocupação na Câmara e no Senado, onde se tenta forjar amarras inúteis no longo prazo. Semana passada a ingerência e a incompreensão do que representa o fenômeno da Internet eram visíveis através das imagens da TV Senado:

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada feira-livre que mobilizava comerciantes e consumidores da região. Isso na época em que não existia a figura do chefe do Executivo, quando as questões administrativas eram resolvidas e encaminhadas pela Câmara Municipal.           

Patrimônio Cultural de Feira de Santana I

A Sede da Prefeitura Municipal A história do prédio da Prefeitura Municipal de Feira de Santana começou há 129 anos, em 1880. Naquela oportunidade, a Câmara Municipal adquiriu o imóvel para sediar o Executivo, que não dispunha de instalações adequadas. Hoje talvez cause estranheza a iniciativa partir do Legislativo, mas é que naqueles anos os vereadores acumulavam o papel reservado aos atuais prefeitos. Em 1906 o município crescia e o prédio de então já não atendia às necessidades do Executivo. Foi, então, adquirido um outro imóvel utilizado como anexo da prefeitura. Passaram-se 14 anos e veio a iniciativa de se construir um prédio único e que abrigasse com comodidade a administração municipal. Após a autorização da construção da nova sede em 1920, o intendente Bernardino Bahia lançou a pedra fundamental em 1921. O engenheiro Acciolly Ferreira da Silva assumiu a responsabilidade técnica. No início do século XX Feira de Santana experimentou uma robusta expansão urbana. Além do prédio da