No
final do segundo mandato, em 2001, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso
tomou uma decisão histórica: assinou um decreto que determinava o fim dos
manicômios no Brasil. A medida convergia com o esforço de décadas dos que
advogavam pelo fim daquelas instituições que se pareciam com “depósitos de
seres humanos”, de tão degradantes. Com a medida, a internação compulsória foi
substituída pelo acompanhamento médico, com a possibilidade dos pacientes ficarem
em casa. As famílias que acolhessem seus pacientes passaram a ter direito a um
salário-mínimo mensal.
Para
além da dimensão humanitária, o Ministério da Fazenda espichava o olho para o
aspecto financeiro: essa medida custava menos que manter pacientes reclusos em condições
subumanas. Houve quem protestasse, prevendo multidões de loucos violentos pelas
ruas. Não foi o que aconteceu.
A
atual crise no sistema carcerário pode levar à adoção de medidas semelhantes.
Cerca de 40% dos presos nos cárceres brasileiros são provisórios, estão
aguardando julgamento; outros tantos estão presos por delitos menos graves, sem
uso da violência. Poderiam, portanto, estar cumprindo pelas alternativas, ao
invés de reforçar, compulsoriamente, as facções que dominam as cadeias.
Por
outro lado, o garrote fiscal aplicado com a PEC do Teto de Gastos começa a se
revelar. Não vão existir recursos adicionais para medidas emergenciais no
sistema prisional: ou se tira de outros setores, ou quem gerencia as cadeias
vai ter que se virar com o que tem hoje. Aposto que ninguém vai propor, por
exemplo, tirar dinheiro da saúde e da educação para aplicar nos presídios. Seria
suicídio político.
Insustentável
Como
a situação nas cadeias é insustentável, então resta uma saída: desafogá-las,
concedendo a liberdade a muitos presos que poderiam cumprir punição nas ruas, através
de medidas alternativas. Até a própria imprensa – sempre com a língua em riste
para exigir punições severas – está tendo que aquiescer: como está para o caos chegar
às ruas é questão de tempo.
Resta
saber que governo vai assumir a tarefa de, pelo menos, atenuar no curto prazo a
crise no sistema carcerário. O que aí está não vai além de minimizar os
acontecimentos ou requentar planos antigos, de eficácia duvidosa; em 15 dias,
ficou patente que o crime encastelado nas prisões está muito mais organizado
que o governo de Michel Temer (PMDB-SP).
A
gravidade da situação não permite o luxo de prolongadas confabulações ou de
intermináveis tratativas, como está acontecendo. Nesse caso, a inércia é
sinônimo de mais mortes nas cadeias e nas ruas, apesar de todo o discurso do
“controle” evocado nos últimos dias.
A iniciativa de
desafogar as prisões passa, sobretudo, pelo Judiciário. Caso a ideia prospere –
e não se trate de mera reação diante dos massacres no Amazonas, em Roraima e,
agora, no Rio Grande do Norte – pode ser que, lá adiante, se veja alguma saída
para a aterradora situação penal brasileira.
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