Quando
criança escutava, horrorizado, os relatos de que Fidel Castro mandava fuzilar, incontinenti, quem se dedicasse a
rituais religiosos na ilha que governava com mão de ferro. Ás vezes, lá pela
década de oitenta, via no noticiário que um padre ou um frade fora preso porque
falava mal do regime; ou porque denunciava torturas de presos políticos a mando
dos comunistas que controlavam Cuba.
Nas
andanças por Havana, pude observar que prevalece um sincretismo religioso
semelhante àquilo que se pratica na Bahia e em outros lugares Brasil afora.
Batistas, católicos, os chamados neo-pentecostais e religiões de matriz
africana coexistem na ilha embora, aparentemente, não haja enorme entusiasmo
pelas igrejas.
Na
Havana antiga existem muitas edificações religiosas: conventos católicos que
atraem cliques dos turistas; igrejas suntuosas erguidas no apogeu da dominação
espanhola; e, mais recentes, templos batistas provavelmente legados pelos
norte-americanos na primeira metade do século XX.
Até
então, tudo normal: à exceção dos radicais talebãs, no Afeganistão, poucas
revoluções conduziram à supressão física de símbolos religiosos. A surpresa
veio com a constatação de que as funções religiosas tem curso frequente na
ilha: numa rua estreita que conduz ao Capitólio – Havana também tem um
Capitólio idêntico ao de Washington – havia uma igreja batista onde entoavam um
cântico religioso. Isso numa prosaica manhã ensolarada de quarta-feira.
Num
domingo, constatei que os atos religiosos tem força relativa: na Catedral de
Havana, uma igreja de arquitetura sofisticada e solenes pedras escuras,
acompanhei parte de uma missa pela manhã. A assistência era mínima: uns poucos
turistas interessados nas imagens, umas freiras de alguma congregação e o padre
tão enfático que parecia pregar para uma multidão.
Mais
tarde, durante uma extensa caminhada, decidi fotografar uma igreja cuja cúpula
se destacava no casario. Quando me aproximava, a surpresa: um batuque
contagiante que lembrava os candomblés da Bahia inundou meus ouvidos. Vinha das
proximidades: em poucos minutos, localizei: na sala de uma pequena casa,
exatamente em frente à igreja, umas dez pessoas dedicavam-se a algum ritual
religioso.
Havia
flores brancas em abundância, água e pessoas vestidas de branco. Curiosamente,
todas tinham a pele muito branca. O batuque cessou. Aguardei mais uns minutos,
em vão: terminara o ritual.
Antes,
no Vedado, vira um rito dessas igrejas chamadas neo-pentecostais: o mesmo tom
furioso de voz que se desdobrava em momentos de tormentosa lamentação; as
bíblias empunhadas com fúria, os mesmos colarinhos engomados e os mesmos
vestidos pudicamente compridos que se vêem no Brasil.
Constatava,
enfim, que a Fé e o método da Fé não têm fronteiras, nem embaraços ideológicos.
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