Certamente o leitor desta Tribuna deve estar enfadado com o noticiário repetitivo e previsível sobre o horário eleitoral. Mas, embora me exponha ao risco de não ser lido – já que abordarei, mais uma vez, a campanha em andamento – aproveito para compartilhar algumas observações feitas de passagem em programas esparsos. A primeira observação é que a baixaria de fato está apenas começando. Contrariando a canção de Beto Guedes, quando entrar setembro a boa nova não vai andar nos campos, mas sim a baixaria no horário eleitoral. Pelo menos neste 2010, cujo setembro, a propósito, já começou.
À medida que os discursos e as promessas se tornam ineficazes e alguns candidatos disparam, os potenciais perdedores apelam e apelam feio. Nesse compasso “factóides” são criados, a imprensa alinhada amplifica e “levanta a bola” para as eventuais vítimas – que são candidatos mal-cotados – chutarem com calculada indignação.
Todo dia surge vazamento de sigilo fiscal, imediatamente associado à campanha eleitoral. A estratégia é empregada quando a discussão de propostas e o debate em torno das ações de governo não surtem efeito. É o que tem feito José Serra nos últimos dias e que deve se intensificar até o início de outubro. Até lá ninguém duvide que surjam acusações de ligações do PT com Bin Laden ou com a máfia italiana.
Se Serra enquadrasse seus aliados nos estados, talvez o efeito fosse mais favorável. Pouca gente pede votos para ele na Bahia e até o seu principal aliado no estado – Paulo Souto – deu entrevista recente eximindo o presidente Lula dos problemas de saúde e segurança na Bahia. Noutros tempos, enfiaria todo mundo no mesmo balaio, mas como não pode ficar mal com o eleitorado baiano, preserva-se preservando Lula, mas, por tabela, expondo Zé Serra.
Pai da Criança
Mas não somente isso chama a atenção nas eleições de 2010. No horário eleitoral da Bahia, todo mundo é “pai de alguma criança” – bonita – no cenário político. Tem relator do fundo de combate à pobreza, tem responsável pelo Bolsa Família, tem gente ajudando Lula no Senado e no Congresso – gente que ainda ontem fazia críticas ácidas, diga-se de passagem – e tem gente com propostas brilhantes a serem apresentadas oportunamente.
Note-se que todas essas figuras há quatro anos demonizavam o Bolsa-Família classificado como “assistencialista” e “eleitoreiro”. Hoje todo mundo é co-responsável e até Zé Serra – já desesperado – disse que vai dobrar o valor repassado pelo programa. Mais eleitoreiro impossível.
Por enquanto ainda não apareceu ninguém postulando a condição de autor do “ficha-limpa” – já que o projeto foi fruto de iniciativa popular – mas tem relator, como o vice de Zé Serra que usa a condição como chamariz de sua apagada trajetória no Congresso Nacional.
Sem novidades
Essas novidades no miúdo, todavia, não impedem a percepção de que, no atacado, há muito pouca novidade no cenário político. No governo do estado os principais candidatos – Jaques Wagner e Paulo Souto – são os mesmos há três eleições e, a essas alturas, o eleitor já sabe quem fez o quê e o que pode fazer. Geddel Vieira Lima figura mais como uma excentricidade.
Até a baixaria é previsível, assim como o descontentamento do eleitor com essa estratégia, confirmada em incontáveis pesquisas. Quanto mais humilde o eleitor – e, portanto, mais exposto às dificuldades da vida – maior a ojeriza pelo vale-tudo eleitoral. Afinal, enfrentar as mazelas do dia-a-dia e, à noite, se deparar com uma verdadeira guerra na tevê é dose pra leão.
As excelências que recorrem ao vale-tudo desfilam em carros blindados com motorista, viajam em jatinhos particulares, residem em luxuosas residências e, quando extenuados, repousam em praias paradisíacas ou em confortáveis casas de campo. Podem, portanto, dedicar-se ao belicismo político sem maiores neuroses. O eleitorado exposto aos crônicos problemas cotidianos não pode se dar ao mesmo luxo. Se o fizer, certamente não encontrará no Sistema Único de Saúde elegantes divãs onde possam trabalhar seus traumas com renomados psicanalistas...
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