- Só vale se
o sujeito só tiver 500 reais na conta...
O raciocínio
é de um motoboy aqui da Feira de Santana. Comentava a notícia do dia: os saques,
autorizados pelo governo, do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, o FGTS,
das contas individuais dos trabalhadores. Reclamava das restrições marotas para
saques posteriores: quem aderir, segundo ele, depois não vai poder sacar o
valor integral. Melhor deixar o valor lá e sacar numa eventual demissão, que
nunca pode ser descartada. Afinal, a crise segue, implacável.
Agachados,
ele e um colega conversavam numa esquina feirense, à espera de clientes. As
motos estavam estacionadas sobre as pedras portuguesas do calçamento. No céu, nuvens
encardidas insinuavam uma chuva improvável. O sol tépido do inverno prevalecia.
No cruzamento, motociclistas e motoristas, ansiosos, angustiavam-se com o sinal
fechado. Às vezes alguém, cavalgando uma moto, avançava, indócil, numa manobra
arriscada.
-É o governo
tentando movimentar a economia. Tá tudo parado – reclamou, com razão.
Segundo ele,
o paradeiro contamina a economia feirense: ninguém faz negócio, ninguém se
arrisca, ninguém coça o bolso. Quem trabalha, sofre porque o dinheiro não
circula. O raciocínio foi intercalado por palavrões. Políticos eram,
obviamente, os alvos preferenciais dos xingamentos. Atinham-se ao
presente: melhor não se aventurar pelo imponderável, o futuro arisco e pouco promissor.
Quando chega
um cliente, combina-se a corrida com poucas palavras. Quem requisita a viagem
informa o destino, ouve a proposta, às vezes faz uma contraproposta. Os preços
são baixos: é grande a concorrência, que inclui os aplicativos de transporte. É
mais negócio fazer o dinheiro girar, mesmo que o lucro seja modesto. No início de tarde de quinta-feira, porém,
estavam ociosos.
Pelas
avenidas feirenses, muita gente oferece corrida a clientes potenciais: buzinam,
gesticulam, às vezes gritam: “Motoboy?”. Poucos exibem aquela camisa
padronizada da prefeitura, dos concessionários. Boa parte se aventura: num
deslocamento qualquer, caso surja cliente, não desperdiçam a chance de embolsar
uns trocados.
Motocicletas
novas, antigas, possantes ou de 125 cilindradas empregam-se no ofício; não
falta quem ofereça corrida a bordo de uma motoneta, as afamadas “cinquentinhas”.
No precário mercado de trabalho feirense, cobrar legalidade se tornou até excentricidade:
pouca gente perde tempo reivindicando formalidade.
A dupla na
esquina enfiou a corrupção na conversa. Indignados, reclamavam da roubalheira.
Não poupavam ninguém: na geleia geral da política brasileira, todo mundo é
ladrão. E foi essa ladroagem que conduziu à recessão e à estagnação da
economia. Alisando o casaco surrado um deles repetia, renitente, explicando o
desastre econômico:
-É a política... – e espichava o olho para as
lojas vazias do outro lado da rua.
Comentários
Postar um comentário