No início da
tarde de ontem (29) recebi um vídeo que, segundo quem compartilhava, foi feito
na cadeia de Altamira, lá no Pará, durante o massacre que vitimou 57 presos, na
manhã do mesmo dia. Chegou logo depois que o assunto ganhou as manchetes de
todos os sites e telejornais do País. É difícil encontrar palavras que traduzam
o horror que se desenrola em ínfimos 17 segundos.
Logo no
começo é possível identificar o vozerio grosseiro, grave, típico dos espaços de
confinamento. A câmera foca cinco cabeças dispostas junto a uma parede. É
possível perceber que os decapitados são gente muito jovem. Um deles até exibe
um corte da moda, estilo moicano, desses que a garotada adota com frequência.
“É nóis, é
nóis”, berra alguém, talvez o próprio cinegrafista. Depois aparece uma mão fazendo
um gesto de celebração ou de deboche. Mais uma cabeça é lançada sobre as
demais: um barbudo, com o rosto ensanguentado. Agora, só ali, são seis
infelizes decapitados. A contabilidade oficial apurou 16 cabeças cortadas.
Insatisfeito
com a demonstração de selvageria, um dos presos puxa uma cabeças com o pé
direito e faz uma manobra típica de jogador de futebol de várzea. Na mão, exibe
um longo facão improvisado. Tudo indica que a arma foi forjada utilizando uma
chapa de aço que, talvez, reforce as grades dos portões da própria prisão.
As cenas são
chocantes. Mas, no circuito dos entreveros entre facções criminosas nas
prisões, vem se tornando quase banal. Não basta eliminar o inimigo, tampouco
trucidá-lo: é necessário ostentar selvageria, desdém absoluto pela vida e até pelo
cadáver do rival eliminado.
Massacres do
gênero estão se tornando rotina nas prisões do País. Em maio, morreram mais de
50 no Amazonas. E, nos dois anos anteriores, morreu mais gente no próprio
Amazonas, em Rondônia, no Acre e no Rio Grande do Norte. Somados, são centenas
de cadáveres só nos maiores conflitos. Tudo por conta das contendas entre
facções que disputam as lucrativas rotas do tráfico de drogas no Norte do
Brasil.
A barbárie
não se limita às prisões: questionado sobre o massacre, o “mito” recomendou aos
repórteres que indagassem, primeiro, as vítimas das vítimas do massacre sobre o
que achavam. Depois, poderiam voltar para interpelá-lo. Diante dessa
manifestação, alguém pode alimentar alguma expectativa positiva em relação a
mudanças nesse cenário?
O
encarceramento em massa e as péssimas condições do sistema prisional
impulsionam o recrutamento de mão de obra barata pelas facções. Não se pretende
atacar esses problemas: defendem-se mais prisões, leis mais duras, menos
recursos e mais violência na repressão à criminalidade. Redução da pobreza e
acesso a serviços públicos nem figuram nos discursos.
É impossível a receita não resultar em mais
tragédias como a de ontem.
Comentários
Postar um comentário