Pular para o conteúdo principal

Propaganda eleitoral é diversão garantida

 

Fiquei impressionado com a propaganda eleitoral na televisão. Mais: fiquei entusiasmado. Estamos salvos: há muita gente bem intencionada, altamente qualificada, mobilizada para tornar a Bahia e o Brasil melhores. Quem quiser constatar é só acompanhar as transmissões, no começo da tarde e à noite. Nem vou mencionar as campanhas majoritárias: os candidatos a deputado – estaduais e federais – são suficientes para eletrificar as esperanças de um futuro melhor.

A turma está tão entusiasmada que não se limita ao trivial eleitoral – lutar para melhorar a saúde, a educação, gerar emprego e renda – e avança prometendo assumir funções que, no papel, cabem ao Executivo. Tudo bem: num País em que o presidente da República terceirizou o orçamento para o “Centrão” e vive tentando usurpar atribuições do Judiciário, não há problema nenhum.

Há os insatisfeitos – sempre há os insatisfeitos – que reclamam dos chavões, dos clichês, das frases feitas que ornamentam as breves falas dos candidatos. Não vejo óbice, como diria o pernóstico. Clichês e frases feitas são melhores que frases espontâneas. Imaginem se essa gente resolve dizer o que pensa, recorrendo a toda sua presumida bagagem cultural. Enfim, é melhor que venham os chavões.

Noto, também, que muitos só falam de Deus. É Deus pra lá, Deus pra cá. E olhem que aqui, por enquanto, não é a Síria, o Iraque ou o Afeganistão. Fico imaginando quando vier – se vier – o califado bíblico-miliciano que arde nas entranhas de muitos por aí. Talibã e Estado Islâmico terão muito o que aprender com o Brasil.

Ouvi, também, gente prometendo usar o mandato para “combater o comunismo”, ou algo assim. Deduzo que encorpe uma dessas legendas patrióticas, cristãs, conservadoras. Os candidatos delas, aliás, são os mais divertidos. Fazem caras e bocas, cerram os dentes, lançam chispas, engolem fonemas, um espetáculo. Divertiam mais, porém, quando não estavam no poder, imersos em suas maquinações obscurantistas.

Não é à toa que algumas crianças se divertem tanto com o horário eleitoral. Quando menino, também me divertia bastante. Mas mantive o hábito vida afora, embora a qualidade do espetáculo venha em queda porque, hoje, o ódio é o ingrediente principal. Mas é preciso ter fé: vai que o eleitor faz escolhas melhores desta vez?

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Parlamento não digere a democracia virtual

A tentativa do Congresso Nacional de cercear a liberdade de opinião através da Internet é ao mesmo tempo preocupante e alvissareira. Preocupante por motivos óbvios: trata-se de mais uma ingerência – ou tentativa – da classe política de cercear a liberdade de opinião que a Constituição de 1988 prevê e que, até recentemente, era exercida apenas pelos poucos “privilegiados” que tinham acesso aos meios de comunicação convencionais, como jornais impressos, emissoras de rádio e televisão. Por outro lado, é alvissareira por dois motivos: primeiro porque o acesso e o uso da Internet como meio de comunicação no Brasil vem se difundindo, alcançando dezenas de milhões de brasileiros que integram o universo de “incluídos digitais”. Segundo, porque a expansão já causa imensa preocupação na Câmara e no Senado, onde se tenta forjar amarras inúteis no longo prazo. Semana passada a ingerência e a incompreensão do que representa o fenômeno da Internet eram visíveis através das imagens da TV Senado:

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada feira-livre que mobilizava comerciantes e consumidores da região. Isso na época em que não existia a figura do chefe do Executivo, quando as questões administrativas eram resolvidas e encaminhadas pela Câmara Municipal.           

“Um dia de domingo” na tarde de sábado

  Foi num final de tarde de sábado. Aquela escuridão azulada, típica do entardecer, já se irradiava pelo céu de nuvens acinzentadas. No Cruzeiro, as primeiras sombras envolviam as árvores esguias, o casario acanhado, os pedestres vivazes, os automóveis que avançavam pelas cercanias. No bar antigo – era escuro, piso áspero, paredes descoradas, mesas e cadeiras plásticas – a clientela espalhava-se pelas mesas, litrinhos e litrões esvaziando-se com regularidade. Foi quando o aparelho de som lançou a canção inesperada: “ ... Eu preciso te falar, Te encontrar de qualquer jeito Pra sentar e conversar, Depois andar de encontro ao vento”. Na mesa da calçada, um sujeito de camiseta regata e bermuda de surfista suspendeu a ruidosa conversa, esticou as pernas, sacudiu os pés enfiados numa sandália de dedo. Os olhos percorriam as árvores, a torre da igreja do outro lado da praça, os táxis estacionados. No que pensava? Difícil descobrir. Mas contraiu o rosto numa careta breve, uma express