Três
militares morreram no início da semana passada em uma operação da intervenção
federal no Rio de Janeiro. A ação ocorreu em um complexo de favelas na zona
norte, mas o episódio repercutiu em outras regiões da cidade. Na Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), militares montavam guarda na Estação do BRT,
exatamente em frente à instituição. Portavam fuzis e perscrutavam com olhares
assustados os arredores. Afinal, no início da tarde, um ônibus foi incendiado
por ordem de traficantes. Mesmo com todo o aparato, o caos permanece,
imperturbável.
Uma
pesquisa recente indicou que 59% da população carioca julga que a intervenção –
festejada com arroubos impudentes por seus artífices, em fevereiro – tornou-se
inócua. A percepção é compreensível: tiroteios, mortes e pânico seguem
frequentes, maculando a indescritível beleza dos dias ensolarados de inverno na
afamada Cidade Maravilhosa. Na segunda-feira (20), em Niterói, morreram seis em
um confronto que interrompeu o trânsito pela ponte que liga o município
metropolitano à capital.
Assim,
prossegue o espetáculo da exibição de força. Quem chega à cidade pela Avenida Brasil
e circula pelos bairros da zona norte fica impressionado com o aparato.
Viaturas da Polícia Militar nas esquinas, de prontidão, com o giroflexes ligado
e portas abertas; caminhões do Exército circulando, num ir e vir incessante;
guardas municipais circulando pelo fervilhante centro da cidade. E, aqui ou
ali, viaturas se deslocando com sirenes estridentes.
Contrastando
com o exuberante aparato da Segurança Pública, há a miséria e a exclusão. Ao
longo do canteiro da Avenida Brasil, magotes de desafortunados fumam maconha, consomem
pedras de crack ou bebem aguardente em vasilhames plásticos; muitos se abrigam em
tendas improvisadas com plástico, papelão, lona e bastões de madeira; vários
circulam indiferentes ao trânsito vertiginoso; outros se aventuram pelas
movimentadas artérias que conectam a via com as intermináveis favelas.
Nas
praças do centro da cidade, à frente das antigas e solenes igrejas católicas,
agrupam-se mendigos, moradores de rua e consumidores de drogas, abrigados nas
mesmas tendas precárias, consumindo sobras de comida, entornando cachaça para
suportar aguentar o rojão e esperando sabe-se lá o quê mais adiante, na vida.
São muitos – milhares, certamente – mas sobre esses não existe nenhuma palavra.
Amedrontam e repugnam o cidadão pacífico que vai para suas ocupações.
Na
zona sul – palco dos badalados bairros da gente abastada – militares jovens
circulam em jipes abertos, portando sofisticados fuzis manejados com pouca
intimidade. A encenação parece mais dedicada a transmitir a exaltada sensação
de segurança – confortando a elite residente nas cercanias – que, propriamente,
a se traduzir em qualquer medida mais efetiva de segurança.
Esse
é o contraste dilacerante que caracteriza o Brasil atualmente – não apenas o
Rio de Janeiro – e que, pelo jeito, vai seguir se perpetuando pelos próximos
anos, pois é o que sinaliza o debate eleitoral. De um lado, o discurso da
força, do aparato de segurança, da violência oficial para conter a violência
endêmica; do outro lado, a pobreza, a miséria e a indigência que vai se
ampliando a partir da crise econômica. O
que une os dois enredos? A crença de que, para pobre, reserva-se munição, não
ações civilizatórias de inclusão social.
É
claro que isso não vai conduzir a um futuro melhor. Não é questão de fé,
confiança, otimismo, credulidade em improváveis milagres: é questão de
sensatez. A intervenção federal no Rio de Janeiro não passou de empulhação para
tentar alavancar a natimorta recandidatura presidencial de Michel Temer
(MDB-SP), o mandatário de Tietê. Mas, apesar do fiasco, a disposição
beligerante segue acesa, noutras candidaturas.
Para êxtase da indústria
das armas, que faz da morte um negócio altamente lucrativo.
Comentários
Postar um comentário