Feira de Santana é um
município que exibe a peculiaridade de seu território abrigar dois biomas: a
Caatinga, que se irradia a partir daqui sertões afora, alcançando lonjuras no
Piauí e no Ceará; e a Mata Atlântica, que caracteriza o Recôncavo próximo e se
insinua em direção ao Sudeste, estreitando-se pelo litoral infindável. Biomas
tão distintos produziram, ao longo do tempo, formas de organização da atividade
agropecuária muito específicas. Essa realidade é visível até mesmo numa
despreocupada viagem de passeio.
No sertão semiárido, a
vocação econômica mais evidente é a pecuária bovina. Ela se distribui por
largas extensões de terra, privilegiando espaços onde as fontes hídricas são
mais abundantes. Eventuais roças de mandioca, feijão e milho se insinuam na
paisagem, aonde predomina o som dos chocalhos dos animais que pastam em
extensas planícies.
Aqueles que se deslocam
em direção ao Recôncavo, ao sul, se deparam com cenário bem diverso. É o caso
de quem se aventura em direção a Santo Amaro, trocando a pista dupla da BR 324
pela BA 084, ali na entrada para Conceição do Jacuípe. O trecho surpreende pela
diversidade econômica, que destoa da monocultura da cana-de-açúcar às margens
da BR 324.
O asfalto da rodovia é
áspero e, em alguns trechos, exibe crateras que exigem atenção do motorista.
Não existe acostamento e placas de sinalização alertam para os perigos, que são
muito visíveis: curvas acentuadas e trechos íngremes que serpenteiam abismos de
dezenas de metros. É provável que seja uma das antigas estradas carroçáveis ligando
a Feira de Santana ao Recôncavo. Depois, ganhou pavimentação asfáltica e um
código de rodovia.
Múltiplas
atividades
Nos primeiros
quilômetros o viajante se extasia com a variedade de árvores frutíferas:
jaqueiras imponentes, imensas mangueiras, cajueiros vigorosos, bananeiras
verdejantes e longilíneos coqueiros que balançam ao sabor dos ventos. As
sombras densas das árvores tornam a temperatura amena no entorno.
À sequência de pomares se
veem, também, inúmeras hortas irrigadas nas quais se cultivam hortaliças, como
cebolinha, alface e coentro, que vão abastecer mercados consumidores de Feira
de Santana e até de Salvador. Por ali se vê com facilidade agricultores
atarefados, debruçados sobre seus cultivos.
A intensa atividade
econômica empresta dinamismo à pequena Oliveira dos Campinhos, alguns
quilômetros mais adiante. Restaurantes, mercadinhos e pequenas lojas, que
oferecem produtos diversos, surpreendem o viajante. Mas ali também resiste o
bucolismo da vida rural: existe a igreja, a praça tranquila e, distribuídas nas
cercanias da comunidade, imponentes residências rurais, resquícios arquitetônicos
do início do século XX.
Mais adiante começam as
curvas: a estrada volteia vales, circunda morros e propicia ao viajante cenários
impressionantes, paisagens fantásticas que se estendem até o horizonte
longínquo. Os trechos menos inclinados são pontuados por pastagens nas quais
circulam rebanhos de gado nelore, predominante na região.
Povoações
À medida que Santo
Amaro se aproxima, prevalece uma planície monótona, típica das áreas de cultivo
da cana-de-açúcar. Mas ali se sucedem pastagens, com raras árvores, sob cujas
sombras bois e cavalos resguardam-se do sol implacável do meio-dia.
Contrastando com a pecuária, veem-se pequenos cultivos de mandioca em
propriedades de agricultores pobres. Adiante, ressurgem pomares.
Povoados surgem e,
neles, a comunidade negra vende frutas ou aguarda clientes nas biroscas às
margens da rodovia. Há sempre mesas e cadeiras plásticas, amarelas ou brancas,
além de banners de cervejarias multicoloridos.
Algumas placas substituem cardápios, anunciando caldo de sururu, maniçoba ou feijoada,
sempre servida aos sábados.
Mais adiante, numa
bifurcação após pontes sobre rios estreitos, dobra-se à direita, onde começa a
BA 510 em direção às comunidades Pedras, Vitória e Quilômetro 25. São povoações
minúsculas, com ruas estreitas, íngremes, calçadas com paralelepípedos recobertos
pela poeira. As casas são hermeticamente fechadas, em sua maioria, por portões
metálicos inteiriços ou com grades.
Nativos amontoam-se nos
bares: bebem cerveja, conversam aos berros em torno de mesas de sinuca e, sobretudo,
ouvem os clássicos do arrocha. Placas anunciam a venda de “geladinho” e
“geladão”; jovens dedicam-se ao ofício de barbeiro no hall de casas modestas. Não se veem brancos nessas comunidades.
Rica
Diversidade
Nas vertiginosas
descidas que antecedem a chegada à BA 420, entre Cachoeira e Santo Amaro,
sucedem-se bambuzais ressequidos. Vê-se também novas roças de mandioca e a
miséria exposta em casas de varas e barro batido. Mulheres se mexem, com
panelas, atarefadas no preparo do almoço. Garotos galopam, lépidos, sobre o
lombo de jumentos e cavalos. Chega-se, enfim, à BA 420, que une duas das mais
emblemáticas cidades da região.
É rica a diversidade
econômica do Recôncavo. Isso também contribui para forjar as inúmeras dimensões
da efervescente cultura local. Numa despretensiosa viagem, examinando a
rodovia, veem-se cenários muito distintos numa extensão de escassos 22
quilômetros. A Feira de Santana – fervilhante meca comercial da região – também
é parte dessa riqueza, fazendo circular a produção do entorno.
Vale a pena viajar
pelo Recôncavo e conhecer as belezas de um dos mais especiais pedaços do
Brasil.
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