Pular para o conteúdo principal

A agenda negativa do transporte coletivo


Semana passada, mais uma vez, o transporte coletivo em Feira de Santana voltou ao noticiário de forma negativa. Moradores do Corredor dos Araçás, revoltados, fizeram uma manifestação protestando contra o serviço prestado. Interditaram uma rua, exigiram providências, a imprensa divulgou o episódio e até vereador apareceu no local, mesmo não sendo ano de eleição. De imediato, programou-se reunião na prefeitura e o sindicato das empresas anunciou que novos ônibus estarão em circulação nos próximos dias, o que sempre ocorre nesses casos.
Em abril, quando o reajuste para R$ 2 foi anunciado, tornando a tarifa no município uma das mais caras do Brasil, inclusive em relação às capitais, houve muita indignação e alguns exageros. Cercar o carro do prefeito na avenida Getúlio Vargas foi um gesto infeliz dos estudantes, mas nem por isso eles deveriam abandonar o debate sobre a questão, o que acabou acontecendo.
Mais que infeliz, patético, foi o jogo de empurra entre o prefeito e o Conselho Municipal de Transportes (CMT), que se esquivavam da responsabilidade sobre o reajuste, quando o feirense dançava atrás do trio elétrico em plena Micareta. Essa tibieza e a ausência de justificativa plausível para o aumento entornaram o caldo.
No entanto, depois de algumas radicalizações, o debate morreu. Estudantes voltaram às aulas, trabalhadores ao trabalho e todos tiveram que desembolsar preciosos R$ 2 para sacolejar em veículos velhos, empoeirados, inseguros e cujos horários são um mistério quase tão indecifrável quanto a planilha de custos que aumenta a passagem a cada ano.

Discussão

A manifestação no Corredor dos Araçás foi apenas mais um sintoma de que o transporte público em Feira de Santana não anda nada bem. É necessário rediscutir e reestruturar o CMT – o que foi cogitado e não aconteceu -, é preciso ouvir o feirense nos bairros sobre os serviços prestados e é necessário que as autoridades se comprometam com a resolução do caos, impondo às empresas a renovação da frota, o cumprimento dos horários e a conservação dos veículos.
O sindicato patronal alega que a clandestinidade impede a prestação de melhores serviços. Embora o argumento pareça mais uma desculpa esfarrapada, o fato é que a fiscalização e repressão ao transporte irregular cabem à prefeitura. Nem precisa ser bom entendedor para perceber que, se é assim mesmo, a prefeitura está sendo negligente.
É curioso, mas quando o Sistema Integrado de Transporte (SIT) entrou em operação, o discurso era exatamente outro: a reformulação, que atrelou vans e similares ao sistema de forma não concorrencial, erradicaria a clandestinidade e garantiria bons serviços. Não foi o que aconteceu.

Até quando?

Mofando nos pontos, sob chuva ou sob o sol, o feirense se pergunta quando o transporte coletivo no município vai melhorar. Irônico é que, há cerca de dez anos, o serviço já era deficiente, mas infinitamente melhor do que nos dias atuais. Cabe aos responsáveis explicar o que vem acontecendo.
Essas explicações, no entanto, não costumam vir sem pressões. Os feirenses – particularmente os estudantes – precisam se engajar novamente na discussão sobre o transporte público. Se não o fizerem, 2010 reservará o capítulo reprisado de 2009: novo aumento, algumas manifestações de insatisfação, a choradeira habitual dos empresários, as justificativas costumeiras da prefeitura e os velhos ônibus rolando por ruas e avenidas.Plana, com distâncias curtas e ocupação urbana concêntrica, Feira de Santana reúne todos os predicados para oferecer, sem grandes dificuldades, um serviço de transporte coletivo barato e eficiente para seus moradores. Pelo que foi demonstrado quinta-feira, é somente isso que os moradores do Corredor dos Araçás reivindicam.

Comentários

  1. Protestam e com razão,pois é a unica forma dos responsaveis tomarem providência,quando se tenta resoler problemas desse tipo ou com uma gravidade maior os funcionarios que se dizem reponder pela impresa simplesmente ignoram,a população em geral tem que protestar pedir melhora e conforto.
    Podemos exigir pois pagamos o valor de passagem mais cara do pais.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

O Parlamento não digere a democracia virtual

A tentativa do Congresso Nacional de cercear a liberdade de opinião através da Internet é ao mesmo tempo preocupante e alvissareira. Preocupante por motivos óbvios: trata-se de mais uma ingerência – ou tentativa – da classe política de cercear a liberdade de opinião que a Constituição de 1988 prevê e que, até recentemente, era exercida apenas pelos poucos “privilegiados” que tinham acesso aos meios de comunicação convencionais, como jornais impressos, emissoras de rádio e televisão. Por outro lado, é alvissareira por dois motivos: primeiro porque o acesso e o uso da Internet como meio de comunicação no Brasil vem se difundindo, alcançando dezenas de milhões de brasileiros que integram o universo de “incluídos digitais”. Segundo, porque a expansão já causa imensa preocupação na Câmara e no Senado, onde se tenta forjar amarras inúteis no longo prazo. Semana passada a ingerência e a incompreensão do que representa o fenômeno da Internet eram visíveis através das imagens da TV Senado:

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada feira-livre que mobilizava comerciantes e consumidores da região. Isso na época em que não existia a figura do chefe do Executivo, quando as questões administrativas eram resolvidas e encaminhadas pela Câmara Municipal.           

“Um dia de domingo” na tarde de sábado

  Foi num final de tarde de sábado. Aquela escuridão azulada, típica do entardecer, já se irradiava pelo céu de nuvens acinzentadas. No Cruzeiro, as primeiras sombras envolviam as árvores esguias, o casario acanhado, os pedestres vivazes, os automóveis que avançavam pelas cercanias. No bar antigo – era escuro, piso áspero, paredes descoradas, mesas e cadeiras plásticas – a clientela espalhava-se pelas mesas, litrinhos e litrões esvaziando-se com regularidade. Foi quando o aparelho de som lançou a canção inesperada: “ ... Eu preciso te falar, Te encontrar de qualquer jeito Pra sentar e conversar, Depois andar de encontro ao vento”. Na mesa da calçada, um sujeito de camiseta regata e bermuda de surfista suspendeu a ruidosa conversa, esticou as pernas, sacudiu os pés enfiados numa sandália de dedo. Os olhos percorriam as árvores, a torre da igreja do outro lado da praça, os táxis estacionados. No que pensava? Difícil descobrir. Mas contraiu o rosto numa careta breve, uma express