Pular para o conteúdo principal

Uma das passagens mais caras do Brasil

Foi lamentável a pichação no prédio da Prefeitura Municipal, reformado recentemente, em protesto pelo aumento que se aproxima no preço das passagens de ônibus. Mas, mais lamentável ainda, foi a reunião do Conselho Municipal de Transportes, às vésperas do longo feriado de Micareta, para decidir pelo aumento no valor da tarifa, proposto para subir dos atuais R$ 1,85 para R$ 2,00. A finalidade foi, sem dúvida, atenuar o desgaste junto à população, particularmente a classe estudantil. Aliás, essa prática tem precedente, já que tempos atrás houve reunião para tratar do mesmo assunto às vésperas do reveillon.
A elevação dos preços de tarifas públicas é sempre uma medida impopular. Mas quando ocorre dessa forma, às escondidas, aproveitando-se de feriados prolongados, só pode significar covardia ou a consciência de que a qualidade do serviço prestado à população não é compatível com o preço e que o momento de crise econômica não é oportuno para medidas dessa natureza.
Confirmando-se o reajuste para R$ 2,00, Feira de Santana terá uma das passagens de ônibus mais caras do Brasil. Para constatar, basta uma comparação com os preços cobrados nas capitais. Dados de 12 de janeiro de 2009, disponíveis no site http://aumentonao2009.wordpress.com/2009/02/ mostram que a Princesa do Sertão só perde para nove capitais e empata com outras cinco no nada honroso décimo lugar.
O detalhe é que à frente de Feira de Santana estão cidades como Florianópolis, São Paulo, Curitiba e Belo Horizonte, além de Salvador, que contam com um sistema de transporte muito melhor que o ofertado à população feirense. Isso sem contar a renda per capita, mais elevada nessas cidades.

Outras capitais

Empatamos com Brasília e Goiânia, cidades muito maiores e cuja renda da população é, evidentemente, bem mais elevada que a dos feirenses. E estamos à frente de diversas capitais: Fortaleza, São Luís, Belém, Palmas, Aracaju, Vitória e Recife, para não tornar a lista exaustiva. Embora boa parte dessas cidades esteja no Nordeste – cuja população tem renda menor – ressalte-se que o serviço prestado pelas empresas de ônibus nessas cidades não é precário como na Princesa do Sertão.
Feira de Santana deu um passo adiante com a reorganização do sistema de transporte e a entrada em operação de estações de transbordo. Isso é inquestionável e contribuiu para uma maior racionalização do sistema, embora ainda persistam falhas que precisam ser corrigidas.
A situação lastimável dos ônibus que circulam, o tempo de espera nos pontos – principalmente nos finais de semana – e a precariedade do serviço em certos bairros exigem medidas enérgicas dos órgãos responsáveis. E esses, ao longo dos anos, vêm se omitindo de forma sistemática e inexplicável.

Crise econômica

Nenhum argumento apresentado até o momento é convincente em relação ao reajuste. Afinal, apesar dos anúncios não se vêem ônibus novos em circulação e, não raramente, vários deles quebram pela cidade, causando transtornos para usuários e engarrafamentos quando a quebra ocorre em locais como a Avenida Senhor dos Passos.
Outro detalhe é que o Brasil vive uma crise econômica que está atirando milhares de trabalhadores ao desemprego e reduzindo os rendimentos de muitos outros. Feira de Santana decerto não está enfrentando nenhuma “marolinha” e os 15 centavos adicionais pesam no bolso dos pais de família que, por exemplo, têm filhos na escola e precisam se deslocar de ônibus.
Sob todos os pontos de vista, o aumento na passagem é injustificado: primeiro porque não houve transparência na reunião do Conselho Municipal de Transportes – cujos membros, aliás, ou votaram a favor ou se abstiveram, aceitando tacitamente o reajuste -; segundo porque a cada aumento se fala em melhoria na qualidade do serviço, com ônibus novos que nunca chegam; terceiro porque o reajuste ocorre no mais inadequado dos momentos, em plena crise econômica.
Resta, contudo, a triste ironia de que Feira de Santana é destaque no transporte público, com uma das passagens mais caras do Brasil...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Parlamento não digere a democracia virtual

A tentativa do Congresso Nacional de cercear a liberdade de opinião através da Internet é ao mesmo tempo preocupante e alvissareira. Preocupante por motivos óbvios: trata-se de mais uma ingerência – ou tentativa – da classe política de cercear a liberdade de opinião que a Constituição de 1988 prevê e que, até recentemente, era exercida apenas pelos poucos “privilegiados” que tinham acesso aos meios de comunicação convencionais, como jornais impressos, emissoras de rádio e televisão. Por outro lado, é alvissareira por dois motivos: primeiro porque o acesso e o uso da Internet como meio de comunicação no Brasil vem se difundindo, alcançando dezenas de milhões de brasileiros que integram o universo de “incluídos digitais”. Segundo, porque a expansão já causa imensa preocupação na Câmara e no Senado, onde se tenta forjar amarras inúteis no longo prazo. Semana passada a ingerência e a incompreensão do que representa o fenômeno da Internet eram visíveis através das imagens da TV Senado:

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada feira-livre que mobilizava comerciantes e consumidores da região. Isso na época em que não existia a figura do chefe do Executivo, quando as questões administrativas eram resolvidas e encaminhadas pela Câmara Municipal.           

“Um dia de domingo” na tarde de sábado

  Foi num final de tarde de sábado. Aquela escuridão azulada, típica do entardecer, já se irradiava pelo céu de nuvens acinzentadas. No Cruzeiro, as primeiras sombras envolviam as árvores esguias, o casario acanhado, os pedestres vivazes, os automóveis que avançavam pelas cercanias. No bar antigo – era escuro, piso áspero, paredes descoradas, mesas e cadeiras plásticas – a clientela espalhava-se pelas mesas, litrinhos e litrões esvaziando-se com regularidade. Foi quando o aparelho de som lançou a canção inesperada: “ ... Eu preciso te falar, Te encontrar de qualquer jeito Pra sentar e conversar, Depois andar de encontro ao vento”. Na mesa da calçada, um sujeito de camiseta regata e bermuda de surfista suspendeu a ruidosa conversa, esticou as pernas, sacudiu os pés enfiados numa sandália de dedo. Os olhos percorriam as árvores, a torre da igreja do outro lado da praça, os táxis estacionados. No que pensava? Difícil descobrir. Mas contraiu o rosto numa careta breve, uma express