Dezembro vem
sendo marcado por chuvas intensas aqui na Bahia. Na Feira de Santana às vezes
também chove. Tanto que aquela profusão de luzes e cores que precede o verão
pouco se viu. Muitas nuvens pardas, escuras, encobriram o céu. Sob elas,
destoante, alertando que a estação mais quente do ano se aproxima, só o canto
alegre dos sabiás. Vívido contraste: as nuvens plúmbeas, pesadas, filtrando uma
luz opaca e os sabiás com seus trinados magistrais, entornando vida.
Não é só o
céu feirense que está estranho, sem luz, não. Aquele ânimo característico dos
dezembros – alavancado pelas compras natalinas, pela perspectiva das férias, pela
chegada do verão – também não se vê nos semblantes, não se sente no ar. Os
escassos enfeites natalinos – profusos noutros anos – são bem sintomáticos.
Até se vê
muita gente pelas ruas, pisando os bloquetes do piso intertravado do Novo
Centro feirense. Mas, pelas lojas, não se observa aquela agitação de quem
pesquisa, de quem escolhe, de quem compra, de quem sai feliz com suas sacolas.
O cenário no comércio feirense combina com o desalento que os números sobre a
economia brasileira apontam.
Descontando
os alucinados que enxergam economia crescendo em “v” – desde 2018, no Brasil, a
economia perdeu o status de ciência,
tornando-se objeto do misticismo mais primitivo – o cenário para 2022 é
desalentador. “Estagflação”, dizem os economistas, farejando a perversa
combinação de paradeiro econômico com inflação elevada.
Talvez isso
ajude a explicar a desolação nos rostos de quem circula pela Feira de Santana.
Pior do que o final de ano ruinoso – é a segunda temporada da pandemia – é a
perspectiva de um ano inteiro de sufoco a partir de janeiro. É o mesmo roteiro
há oito anos, é bom não esquecer. Em 2018 ouvi uma frase lapidar, que antecipou
bem o quadriênio que viria pela frente:
– O
brasileiro votou mais preocupado com a bunda dos outros do
que com o próprio bolso. Não vai dar coisa que preste!
Não deu
mesmo. Só ingenuidade e misticismo grosseiro explicam a fé pagã no grotesco
paraíso liberal vendido naquelas eleições. Pelo menos para quem vive do próprio
trabalho e que está aí, enfrentando inúmeras agruras. Afinal, Jair Bolsonaro, o
“mito”, não enganou ninguém e disse que ia governar para os empresários.
Imagino que muito eleitor pobre, distraído, desatento, julgava-se parte deste
escrete.
O discurso
da fé, porém, prevalece. Ocorrerão “milagres” na economia, o País vai
deslanchar. Falar de fome e miséria é antipatriótico, serve apenas para
promover o “comunismo”. O País é democrático, mas só endireitará sob métodos
totalitários. Somos, afinal, guiados por um “messias”. Nesta toada, em quatro
anos, o brasileiro retornará às cavernas.
Tudo isso
impregna o ar feirense, ensombrece as feições do consumidor desalentado com os
preços, com as incertezas. Mas é bom cultivar algum otimismo, mesmo que
moderado. Quem sabe se daqui a um ano o País não estará vendo esta noite
interminável começar a se dissipar? Quem sabe se já não haverá sorrisos, mesmo
que ainda contraídos? Quem sabe se não estaremos resgatando parte da nossa
humanidade que se perdeu?
Fica a
esperança, ainda tênue, dançando no ar...
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