O
casal passou examinando as cercanias da rua silenciosa da Queimadinha. Investigava,
parecia à procura de alguma coisa. Estava, de fato: pouco depois entrou num
terreno baldio e, instantes depois, retornou com uma braçada de freixos,
pequenas hastes de madeira, alguns pedaços de compensado, que se decompunham. A
mulher – resoluta e enérgica – conduzia o achado sob o braço. Sob o sol
vigoroso, caminharam algumas quadras até desaparecer numa esquina qualquer.
A
cena ficou na memória, mas a data exata esqueci. Meses atrás, talvez. Malvestido,
cabelos e pele maltratados, o casal era o retrato destes ásperos tempos para os
mais pobres. Voltei a vê-los semanas depois – sempre passam sob a janela – à
procura de material reciclável: garrafas, plástico, latas, papelão, qualquer
coisa que se converta nalguns trocados que ajudem a mitigar alguma necessidade.
Imagino
que aquela precária braçada de lenha serviu para alimentar alguma fogueira, combustível
para preparar alimentos. Afinal, o preço do botijão de gás tornou-se proibitivo
para os mais pobres. Nem lembro quanto custava à época. Agora, está bem mais
caro: varia entre R$ 95,90 e R$ 97,90 no dinheiro. No cartão o preço é maior:
entre R$ 98,90 e R$ 99,90. Arredondando, o feirense está pagando cem reais pelo
botijão de gás de 13 quilos. Constatei numa consulta pela internet.
Há
cerca de um mês soube que já alcançara a marca dos R$ 100. Quem me falou foi um
conhecido, morador da periferia da Feira de Santana:
–
No dinheiro sai por 85 reais. Fiado, para quem conhece o revendedor, já sai por
100 reais. O prazo para pagar é curto, no máximo 15 dias.
Quanto
custará um botijão de gás a prazo, agora? Talvez, R$ 110, R$ 115. Bem caro para
uma família que sobrevive com um salário-mínimo ou – pior ainda – de políticas
de transferência de renda, como o Bolsa Família. Como o casal que vi, muita
gente está improvisando, recorrendo a todo tipo de material para fazer uma
fogueira que permita preparar suas magras refeições.
Patético,
o desgoverno a toda hora anuncia soluções redentoras: reajustes em benefícios,
vale-gás, o diabo a quatro. Ou – o que é ainda pior – terceiriza
responsabilidades, arranja supostos culpados para a própria incompetência.
Enfim, o velho e rasteiro populismo com doses cavalares de demagogia.
Enquanto
isso, o pobre sofre calado nas periferias e nos bolsões de pobreza, expondo-se
ao risco de acidentes, de queimaduras graves, até de morte. Tudo em nome dos
lucros dos acionistas da Petrobras. Quem circula pela periferia da Feira de
Santana relata cenas do tipo, cada vez mais frequentes. Mas poucos se importam
com essas pessoas.
Por
elas, não se vocifera, com indignação, na tribuna da Câmara Municipal, não se
fazem eloquentes discursos. Afinal, aquilo lá é trincheira de acólitos de Jair
Bolsonaro, o “mito”...
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