Eles começam a
labuta logo às primeiras horas da manhã. Muitos saem de casa quando ainda está
escuro e, silenciosos, vencem as grandes distâncias que separam os lares pobres
da periferia dos pontos de ônibus que conduzem às regiões nobres da capital,
aonde se concentram as oportunidades de trabalho e renda. Outros tantos, mais
afortunados, residem nas inúmeras comunidades carentes encravadas nas
imediações dos bairros nobres. Poupam-se, portanto, dos penosos e intermináveis
deslocamentos na metrópole engarrafada.
Os
ambientes nos quais lutam pela sobrevivência são muito diversos: os corredores
dos ônibus que circulam pela capital, as calçadas fervilhantes de transeuntes
próximas aos shoppings, as estações e terminais de transporte urbano aonde os
passageiros se acotovelam, os becos estreitos do centro antigo de Salvador, as
praias defronte o mar azul, as portas dos colégios e os hospitais públicos
lotados de pacientes, impacientes com as prolongadas esperas.
Vendem
de tudo: balas, chicletes e até pen
drives nos corredores dos ônibus; quinquilharias importadas da China nas
ruas apinhadas do centro; doces e salgados em tabuleiros e carrinhos
engenhosos; Cds e Dvds de apelativo sucesso popular; quentinhas baratas para trabalhadores apressados; além das
tradicionais fitinhas do Senhor do Bonfim para os turistas extasiados que
circulam pelo Pelourinho.
Essa gente,
que fermenta o caldo da cultura soteropolitana e que lhe empresta um ar vivo, repleto
de vozes, risos e olhares, integra um exército composto por centenas de
milhares de baianos. São os vendedores ambulantes e camelôs que, diariamente,
enfrentam a espinhosa rotina das ruas em busca de sobrevivência. Esquecidos
pelo poder público, mercadejam em avenidas, ruas e praças um número incontável
de produtos.
Dados
do Censo 2010 do IBGE apontam que, naquele ano, 215,2 mil trabalhadores da
capital não tinham carteira de trabalho assinada; outros 234,2 mil se
aventuravam por “conta própria” e, além deles, mais 188,2 mil ostentavam a
condição de desempregados. É difícil estimar quantos, nesse espantoso
contingente de 637 mil pessoas, ganhavam a vida sob condições adversas,
vendendo produtos baratos que, muitas vezes, só garantem o suficiente para
comer.
Na
implacável batalha pela sobrevivência, vão provocando transtornos que, somados,
contribuem para elevar o já intolerável estresse urbano: aporrinham passageiros
nos ônibus apinhados; apossam-se das passarelas e vias estreitas produzindo monumentais
congestionamentos humanos; causam impressionante poluição sonora em terminais e
estações com possantes caixas de som; e transformam-se em desagradáveis
obstáculos para os turistas deslumbrados com a beleza de Salvador.
Indistinguíveis
da paisagem urbana da capital, permanecem invisíveis aos olhos do poder
público: nas campanhas eleitorais, como a que se encerrou recentemente, seguem
distantes dos programas de tevê e dos discursos, diluídos na ênfase imutável na
melhoria da saúde, da educação e da segurança pública. E assim, desamparados,
continuam na sina diária de mercadejar seus produtos pobres a preços módicos.
Salvador,
a capital da Bahia, consagrada pelo
marcante traço africano na sua gênese, também exibe na sua essência a gana dos
camelôs e ambulantes que circulam pelas estreitas vias seculares ou pelas
novíssimas artérias que a expansão urbana provocou...
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