Poucas
coisas ajudam a definir e a caracterizar a Feira de Santana tão bem quanto os
olhos d’água. Certamente só as feiras-livres, que nasceram e se expandiram
junto com a recém-declarada metrópole, podem rivalizar em relevância e
identidade, já que o próprio nome da cidade decorre dessa inspiração. Afinal,
no cáustico sertão baiano, a existência de reservatórios de água à flor da
terra, acessíveis aos animais – gado sobretudo – fatigados por extensas
caminhadas configuravam significativo conforto. Recompostos pelos pastos e pela
água abundantes, seguiam para os abatedouros de Salvador, destinados a
alimentar a população da capital baiana.
A
modesta feira-livre inicial multiplicou-se, ganhando praças e vielas;
estendeu-se, mudou de lugar, mobilizou milhares de comerciantes e consumidores;
atraiu visitantes de lugarejos distantes, sua pujança fez fama de boca em boca
sertões afora; depois se diluiu em diversas feiras-livres nos bairros que foram
surgindo com a expansão dos limites urbanos do município; desconcentrou-se, virou
opção aos domingos.
Hoje
sua importância é inegável, apesar de todas as mazelas existentes: sujeira,
desorganização, insegurança, desconforto para consumidores e comerciantes. Mesmo
com todos esses obstáculos, segue associada à identidade do lugar, dinamiza e
injeta vida no comércio do município, atraindo às segundas-feiras e por toda a
semana milhares de visitantes.
Olhos d’água
Os
olhos d’água e as famosas lagoas, por outro lado, foram desaparecendo à medida
que a cidade se expandia. Fartos na Feira de Santana quase rural de outrora, os
olhos d’água foram sendo enterrados pela implacável expansão imobiliária: toneladas
de entulho foram sendo despejadas, sufocando a natureza viva que se manifestava
com a água que escorria tímida em fios suaves.
Hoje
restam, como derradeiras lembranças, os nomes que batizam bairros feirenses: o
antigo Minadouro e os Olhos D’Água. Em localidades rurais, ainda sobrevivem os
olhos d’água das Moças e da Formiga. Muito do que havia foi tragado pela
expansão imobiliária irresponsável, sob toneladas de entulho.
Sem
as lâminas d’água que adornavam a superfície feirense, a temperatura da cidade
se elevou, assemelhando-se àquelas enfrentadas pelo gado e pelos boiadeiros que
se aventuravam nos caminhos para Salvador. Antigo pouso para o gado, a
urbanizada Feira de Santana enfrenta escassez de sombras.
Degradação
Por
outro lado, já estão em curso obras que, provavelmente, vão livrar a Lagoa
Grande do mesmo destino enfrentado por inúmeras lagoas feirenses. A medida –
embora desejável e passível de comemoração – contrasta com a triste situação
das lagoas do Geladinho e do Prato Raso, tragicamente próximas e unidas por
destinos semelhantes.
Depois
de aterrada por décadas a fio, inclusive perdendo parte de sua superfície, a
lagoa do Geladinho, ali nas Baraúnas, foi alvo de uma lastimável intervenção: á
água morta circunda uma ilha árida e despropositada, sem verde ao redor.
Oficialmente, promoveram-se obras de reurbanização no local.
O
que resta da lagoa do Prato Raso desaparece na mesma velocidade em que se
erguem incontáveis imóveis de tijolo vermelho. Razoavelmente preservada até o
início dos anos 1990, tornou-se objeto de cobiça de muitos invasores que, sem
alternativas melhores de moradia, erguem ali suas residências, com a
cumplicidade do poder público.
Existem
esperanças de revitalização das lagoas feirenses? Pelo visto não, pelo menos
para as que já se encontram em estágio mais avançado de degradação.
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