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Logo à saída
do aeroporto se vê o famoso out door
anunciando que, na noite em que o viajante chega em Havana, milhões de crianças
dormirão na rua no mundo, mas que nenhuma delas é cubana. No mais, o entorno do
aeroporto Internacional José Martí é pouco povoado, como tantos outros
aeroportos espalhados pelo mundo. O que desola é a escuridão intuída antes do
desembarque: de fato, as luzes são fugidias e a escuridão é monótona e
incomoda.
O
motorista do táxi é jovem e liga o rádio do carro. Os sons contagiantes da
música caribenha se elevam, ganham a madrugada um pouco fria, afastam o clima
de desolação das longas avenidas desertas. Roda-se bastante e, aos poucos, as
incontáveis árvores que lançam sombras largas cedem lugar a um casario sóbrio,
antigo e mal-conservado.
Quem
está acostumado às ruas estreitas do centro das cidades colonizadas pelos
ibéricos, enxerga alguma familiaridade à medida que o automóvel avança: a
disposição dos imóveis, o estilo arquitetônico, as fachadas descuidadas, tudo lembra
as antigas capitais dos trópicos.
“Aqui
se ouve todos os estilos. Não há censura”, apressa-se em explicar o motorista
do táxi, quando indagado sobre as preferências musicais dos cubanos. O
ecletismo é dispensável, pois a música caribenha é contagiante e resgata
momentos alegres, mesmo com as ruas desertas e a escuridão que se abate,
pesada.
O
Hotel Vedado fica no bairro do mesmo nome, bem perto de La Habana Vieja. Fica perto também do famoso e aristocrático Hotel
Nacional, distante algumas quadras. Graham Greene descreve o bairro com notável
precisão em “Nosso Homem em Havana”. Á
noite, no entanto, é difícil perceber os detalhes e estabelecer uma identidade.
Os hóspedes são
recebidos com gestos solenes à porta do hotel. No saguão o ambiente lembra aqueles
filmes antigos, da primeira metade do século XX: sombras que se insinuam, a
fumaça de cigarro onipresente, formando uma nuvem densa, azul, drinques
coloridos em copos do bar e a música furiosamente alegre. Casais dançam e o
ruído das conversas e das risadas ressoa.
Um funcionário
com bigode ruivo e óculos com armação antiga comanda a recepção. Examina, lento
e burocrático, a tela do computador. Ao redor mulheres conversam, riem alto e
fumam, entretidas. Os móveis são antigos, soam exóticos aos olhos acostumados
ao consumismo capitalista.
Desembaraça-se
a hospedagem. Uma funcionária, que devora um cigarro, é orientada a acompanhar
o hóspede até o quarto. Com umas tragadas sôfregas, termina o cigarro e joga-o,
displicente, numa lixeira. Entra no elevador escuro. Funcionária estatal, não
exibe a humilde submissão dos empregados dos hoteis burgueses, como se dizia no
passado.
É uma das primeiras surpresas da viagem.
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