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Violência em Feira: queda ou trégua?


Dados levantados pela Polícia Civil e amplamente divulgados pela imprensa feirense indicam que o número de assassinatos na Feira de Santana caiu nos dois últimos meses, em relação ao mesmo período do ano anterior. Em abril e maio foram assassinadas, respectivamente, 19 e 24 pessoas, contra 44 e 40 no mesmo período de 2010. Caso seja mantida a tendência atual, em junho o número de homicídios cairá dos alarmantes 40 casos registrados no ano passado. Sinceramente, não é algo que deva ser tão comemorado, cabendo as devidas ressalvas.
Primeiro porque a redução se dá sob uma média altíssima. Em 2010, a Feira de Santana ultrapassou o alarmante número de um assassinato por dia. Isso para uma cidade com pouco mais de 550 mil habitantes e que, formalmente, não enfrenta uma situação de guerra civil.
O segundo motivo é que essa queda surpreendente não traz explicações alvissareiras. Pelo visto, não se trata de uma melhoria sensível na segurança pública. Tampouco parece ser fruto do êxito das campanhas de desarmamento promovidas rotineiramente, com grande estardalhaço. E também, ao que parece, políticas de inclusão social não produzem efeitos tão repentinos.
 Nos meses seguintes o aparente mistério tende a ser desfeito: afinal, nada garante que o número de assassinatos não voltará a crescer. Caso cresça, os meses de abril e maio serão vistos como uma trégua temporária, um armistício precário comum a todas as guerras. Se a tendência de queda se mantiver, outras explicações virão à tona.

Demografia

Talvez uma dessas explicações esteja na dimensão demográfica: não existe um inesgotável exército de jovens excluídos que busque no tráfico e na violência soluções para a sua vida. Sendo assim, a violência tende a crescer, alcançando o ápice e, depois, se estabilizando e declinando. Um homicídio diário na Feira de Santana, atingindo sobretudo jovens negros e pardos da periferia, com baixa escolaridade, parece já uma média estarrecedora.
Grande parte da violência que assola a Bahia provém da disseminação do uso de drogas, sobretudo o crack. Mas, como todas as epidemias, o consumo do crack tende a pelo menos se estabilizar ao longo dos anos, com o extermínio sistemático dos usuários e dos envolvidos com o tráfico. Muito desse extermínio já aconteceu na Feira de Santana ao longo da última década.
Em meados de 2010 publicamos um artigo nessa Tribuna Feirense observando que, embora crescente em termos absolutos, os assassinatos na Feira de Santana percentualmente vinham em expansão mais lenta. Haveria uma tendência à estabilidade que, talvez, já comece a surgir nos dias atuais.

Tragédia

O problema é que a redução da violência – ou a estabilização dos números – ocorre de uma forma perversa: não morre mais gente porque, simplesmente, nem todo mundo é usuário potencial de drogas. E a violência persiste em patamar alarmante, vitimando famílias todos os dias.
Recentemente li num jornal que a disseminação do crack no Brasil ganhou contornos de genocídio, atingindo a população jovem, negra, pouco escolarizada e residente nas periferias das grandes cidades. Talvez o objetivo não tenha sido deliberado, mas os efeitos sinalizam que, de fato, há em curso uma matança de jovens cujos números são difíceis de estimar.
Durante a campanha eleitoral o crack esteve nos discursos dos principais candidatos. Infelizmente, passadas as eleições, o tema sumiu do noticiário e da agenda dos governos. Até a própria oposição reafirma o hábito de só lembrar da periferia em período eleitoral, ao esquecer das vítimas das drogas, depois de divulgados os resultados das urnas...

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