Pular para o conteúdo principal

Utopias bananeiras em Teolândia

 

Numa viagem recente passei por Teolândia, cidade miúda que fica ali no Vale do Jiquiriçá, a pouco mais de 200 quilômetros da Feira de Santana. Lá, residem cerca de 15 mil pessoas, segundo dados do – defasadíssimo – Censo de 2010. A fruticultura é uma das vocações econômicas daquela região. Quem viaja pela BR 101 vê, nos morros arredondados que circundam a rodovia, múltiplos cultivos. Entre eles, se sobressai o da banana. A árvore singular, com suas folhas largas sacudindo ao vento, sobe e desce vale e morros e brota até no solo úmido às margens da estrada.

Na chegada a Teolândia – o casario encarapita-se morro acima estendendo-se quase até o cume barrento, muito íngreme, logo depois do rio Preto – a presença da banana é sufocante. Enfeita as barracas precárias erguidas com bambus, pencas acumulam-se junto aos quebra-molas na BR 101 e são objeto até de um feioso e maltratado monumento numa praça localizada num aclive abrupto.

Sem alternativas melhores de trabalho, parte da população dedica-se à venda da banana in natura nessas barracas precárias ou na pista mesmo, acenando para os viajantes. O risco de acidentes ou de atropelamentos não é negligenciável. Mas na cidade miúda não há alterativas de ocupação, é bom ressaltar. A partir dali, contemplando a infindável faixa de asfalto da rodovia, matutava sobre aquele problema econômico, corriqueiro.

Banana é alimento saudável, nutritivo e pode ser consumido de diversas formas. É possível transformá-lo em doce de calda ou compota, desidratá-lo, produzir balas, iogurte, bolos, até em barra de cereais, enfim, numa infinidade de produtos com maior valor agregado. Isolados, esses trabalhadores dificilmente conseguiriam firmar-se na geração de produtos com mais valor, mesmo os mais simples. Mas, reunidos em cooperativas e com o incentivo do Estado, fica mais fácil. Ou menos complicado.

Para isso, porém, seria preciso fomentar uma cultura cooperativa que, necessariamente, conduziria aquela gente à autonomia e – supremo avanço – à emancipação. Deixariam de depender dos benefícios e auxílios, das benesses dos coroneis locais, da turma que, no Planalto Central, faz da miséria ativo eleitoral. É algo perigoso no Brasil, subversivo, comunista até, diria o conservador alarmado, preocupado com a patuleia independente.

Mas sigo alimentando essas utopias. Aliás, faz muito tempo, atravessando fases distintas, do voluntarismo ingênuo a certo pragmatismo que a maturidade confere. Mesmo neste período de trevas que vamos atravessando a confiança persiste, o que não deixa de ser bom...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Parlamento não digere a democracia virtual

A tentativa do Congresso Nacional de cercear a liberdade de opinião através da Internet é ao mesmo tempo preocupante e alvissareira. Preocupante por motivos óbvios: trata-se de mais uma ingerência – ou tentativa – da classe política de cercear a liberdade de opinião que a Constituição de 1988 prevê e que, até recentemente, era exercida apenas pelos poucos “privilegiados” que tinham acesso aos meios de comunicação convencionais, como jornais impressos, emissoras de rádio e televisão. Por outro lado, é alvissareira por dois motivos: primeiro porque o acesso e o uso da Internet como meio de comunicação no Brasil vem se difundindo, alcançando dezenas de milhões de brasileiros que integram o universo de “incluídos digitais”. Segundo, porque a expansão já causa imensa preocupação na Câmara e no Senado, onde se tenta forjar amarras inúteis no longo prazo. Semana passada a ingerência e a incompreensão do que representa o fenômeno da Internet eram visíveis através das imagens da TV Senado:

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada feira-livre que mobilizava comerciantes e consumidores da região. Isso na época em que não existia a figura do chefe do Executivo, quando as questões administrativas eram resolvidas e encaminhadas pela Câmara Municipal.           

“Um dia de domingo” na tarde de sábado

  Foi num final de tarde de sábado. Aquela escuridão azulada, típica do entardecer, já se irradiava pelo céu de nuvens acinzentadas. No Cruzeiro, as primeiras sombras envolviam as árvores esguias, o casario acanhado, os pedestres vivazes, os automóveis que avançavam pelas cercanias. No bar antigo – era escuro, piso áspero, paredes descoradas, mesas e cadeiras plásticas – a clientela espalhava-se pelas mesas, litrinhos e litrões esvaziando-se com regularidade. Foi quando o aparelho de som lançou a canção inesperada: “ ... Eu preciso te falar, Te encontrar de qualquer jeito Pra sentar e conversar, Depois andar de encontro ao vento”. Na mesa da calçada, um sujeito de camiseta regata e bermuda de surfista suspendeu a ruidosa conversa, esticou as pernas, sacudiu os pés enfiados numa sandália de dedo. Os olhos percorriam as árvores, a torre da igreja do outro lado da praça, os táxis estacionados. No que pensava? Difícil descobrir. Mas contraiu o rosto numa careta breve, uma express