Pular para o conteúdo principal

Desconexos pensamentos carnavalescos

 

Enquanto apreciava o sanguíneo poente feirense – à medida que o verão estertora, os tons do crepúsculo tornam-se dramáticos, melancólicos – pensei numa meia-dúzia de temas para um texto qualquer. Nenhum deles pareceu tão urgente quanto o da guerra na Ucrânia. Não, não vou chatear o leitor desfilando conhecimentos bélicos, nem realizando conferências sobre o Leste Europeu. Não domino nem um assunto, nem outro.

Não sei se é a idade ou outro achaque qualquer, mas confesso que acompanhar noticiário sobre guerra é enfadonho. Aqueles pronunciamentos protocolares de lideranças políticas – que fazem a alegria do jornalismo declaratório –, por exemplo, são fastidiosos. Vão, invariavelmente, do banal ao lugar-comum, do clichê à frase feita. Tomam tempo, não informam e aborrecem.

Pior que isso só a inevitável dicotomia entre bons e maus, justos e perversos, heróis e vilões. A chamada grande imprensa brasileira, por exemplo, coloca Vladimir Putin – o presidente russo – como o monstro a ser combatido e o humorista que preside a Ucrânia, Volodymyr Zelensky, foi alçado à condição de estadista, de combatente da liberdade.

Como não enxergo o conflito como uma espécie de gincana – em que sempre se torce para um dos lados – prefiro pensar que, nesta guerra, como em tantas outras, talvez a explicação, complexa, não caiba numa dicotomia simplória, até pueril. Mas já estou enveredando em terreno de especialistas, que fervilham por aí nos últimos dias. Melhor ocupar-me com as novidades provincianas.

Por aqui, a maior delas é o imbróglio envolvendo a chapa governista. Quem será o candidato a governador da situação? Quando esta já extensa novela terá um desfecho? Supostas notícias se sucedem, caudalosas, no noticiário. Muitas vezes expressam mais o desejo de quem escreve do que, propriamente, fatos. Mas isso é até comum no jornalismo político, sobretudo em momentos de incerteza como o que se vive atualmente. Pior que isso enfada também.

Enfado, aliás, deveria ser palavra banida nesses dias, caso o Carnaval estivesse rolando Brasil afora. Foi corretamente cancelado, mas há no ar um estranho clima de meio feriado, já que muitas atividades foram suspensas até amanhã. Pelas ruas, nota-se as pessoas divididas, um certo espírito folião agita a rotina de trabalho, traz um impulso festivo, mas frustrado.

A noite, todavia, parece a mesma, típica noite de segunda-feira, exangue, pois a febril agitação mercantil exaure a Feira de Santana. Com ela, expira também este texto tortuoso, confuso, indeciso como os bêbados das segundas-feiras de Carnaval. Embora não cultive grande ânsia foliã, torço para que, ano que vem, a festa seja retomada no seu pleno vigor.

Mas, para isso, é necessário que nem Vladimir Putin, nem seus rivais ocidentais resolvam apertar o fatídico botão da guerra nuclear...

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Cultura e História no Mercado de Arte Popular

                                Um dos espaços mais relevantes da história da Feira de Santana é o chamado Mercado de Arte Popular , o MAP. Às vésperas de completar 100 anos – foi inaugurado formalmente em 27 de março de 1915 – o entreposto foi se tornando uma necessidade ainda no século XIX, mas só começou a sair do papel de fato em 1906, quando a Câmara Municipal aprovou o empréstimo de 100 contos de réis que deveria custear sua construção.   Atualmente, o MAP passa por mais uma reforma que, conforme previsão da prefeitura, deverá ser concluída nos próximos meses.                 Antes mesmo da proclamação da República, em 1889, já se discutia na Feira de Santana a necessidade de construção de um entreposto comercial que pudesse abrigar a afamada fei...

Patrimônio Cultural de Feira de Santana I

A Sede da Prefeitura Municipal A história do prédio da Prefeitura Municipal de Feira de Santana começou há 129 anos, em 1880. Naquela oportunidade, a Câmara Municipal adquiriu o imóvel para sediar o Executivo, que não dispunha de instalações adequadas. Hoje talvez cause estranheza a iniciativa partir do Legislativo, mas é que naqueles anos os vereadores acumulavam o papel reservado aos atuais prefeitos. Em 1906 o município crescia e o prédio de então já não atendia às necessidades do Executivo. Foi, então, adquirido um outro imóvel utilizado como anexo da prefeitura. Passaram-se 14 anos e veio a iniciativa de se construir um prédio único e que abrigasse com comodidade a administração municipal. Após a autorização da construção da nova sede em 1920, o intendente Bernardino Bahia lançou a pedra fundamental em 1921. O engenheiro Acciolly Ferreira da Silva assumiu a responsabilidade técnica. No início do século XX Feira de Santana experimentou uma robusta expansão urbana. Além do prédio da...

O futuro das feiras-livres

Os rumos das atividades comerciais são ditados pelos hábitos dos consumidores. A constatação, que é óbvia, se aplica até mesmo aos gêneros de primeira necessidade, como os alimentos. As mudanças no comportamento dos indivíduos favorecem o surgimento de novas atividades comerciais, assim como põem em xeque antigas estratégias de comercialização. A maioria dessas mudanças, porém, ocorre de forma lenta, diluindo a percepção sobre a profundidade e a extensão. Atualmente, por exemplo, vivemos a prolongada transição que tirou as feiras-livres do centro das atividades comerciais. A origem das feiras-livres como estratégia de comercialização surgiu na Idade Média, quando as cidades começavam a florescer. Algumas das maiores cidades européias modernas são frutos das feiras que se organizavam com o propósito de permitir que produtores de distintas localidades comercializassem seus produtos. As distâncias, as dificuldades de locomoção e a intermitência das safras exigiam uma solução que as feiras...