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A Lagoa do “Geladinho”


Embora tardia, a iniciativa de revitalizar o que resta da lagoa existente no bairro Baraúnas, é ainda relevante. Devorada pelo aterramento para construções que foram se sucedendo ao longo dos anos, a “Lagoa do Geladinho”, como é mais conhecida, constitui parte da história da comunidade do seu entorno. A pusilanimidade com que as questões ambientais foram tratadas em Feira de Santana, frente a interesses econômicos diversos e à especulação imobiliária, condenou à extinção muitos mananciais desta cidade famosa por seus “olhos d’água”. Claudicante, o “Geladinho” resiste, sabe Deus até quando.
Em 1985, a lagoa possuía um imenso espelho d’água na forma de um círculo quase perfeito. Havia quem pescasse ali e uns patos navegavam, com as cores de suas penas brancas contrastando vivamente com o verde encarnado da vegetação. Mais ao fundo, em direção à BR 116, havia uma vegetação mais densa que camuflava o espelho d’água.
Nas ensolaradas tardes de sábado, crianças e adolescentes mergulhavam nas águas escuras e profundas da lagoa, buscando refrescar-se. Naquele tempo o entorno era desabitado e via-se, ao longe, o casario da Baraúna de Cima. O ronco dos motores de caminhões e ônibus era mais raro que nos dias atuais.
Há quase um quarto de século, no entanto, o “Geladinho” já sofria degradação havia tempos. Afinal, a antiga rodovia – sem pavimentação – que ligava o centro de Feira de Santana à saída BR 116 norte da cidade passava por ali. Com a construção da Avenida José Falcão, o tráfego foi deslocado, mas o prejuízo ambiental tornou-se permanente.

Comércio

Com o passar dos anos, os prejuízos só se acumularam. A intensificação do tráfego na Feira-Serrinha tornou o trecho atraente para os novos negócios que iam surgindo e a expansão comercial correu às expensas da preservação das antigas lagoas. Intensificavam-se, então, os problemas da outra lagoa próxima: a do Prato Raso.
Essa sofreu com a construção de casas que iam prolongando as ruas do bairro Queimadinha. Aterramentos precários e a excessiva proximidade da lagoa provocavam alagamentos de residências nos períodos mais chuvosos, alçando à condição de problema de saúde pública a grave questão social da habitação no município.
Nos últimos anos a questão ambiental se impôs na agenda social e em Feira de Santana não poderia ser diferente: surgiram organizações não-governamentais para defender o meioambiente no município, especialistas começaram a ser ouvidos e a Feira de Santana se deu conta da imensidão dos prejuízos provocados pela expansão urbana sem política ambiental.

Outras lagoas

As lagoas e olhos d’água são parte do patrimônio dessa cidade. Muitas foram totalmente destruídas, outras estão em vias de extinção e as que sobrevivem, desaparecerão sem uma ação enérgica da sociedade. O anúncio de que as obras na “Lagoa do Geladinho” serão retomadas chega em boa hora.
É preocupante, no entanto, saber que obras com tamanha relevância ambiental são tocadas por empresas que vencem licitações e não tem sustentabilidade financeira para concluí-las. Ou a prefeitura torna-se mais criteriosa em relação à questão ou os cofres públicos e os frágeis ecossistemas poderão sofrer as consequências. A essas alturas, as frágeis lagoas não podem se expor ao amadorismo do subfaturamento para vencer licitações, por exemplo.
Resta saber o que será feito em relação aos demais mananciais. Embora a expansão urbana pareça ter perdido parte do fôlego em relação às décadas anteriores e hoje exista uma preocupação legítima da sociedade com a preservação do meioambiente, há medidas que exigem urgência. Caso contrário, as lagoas que restam em Feira de Santana vão se tornar apenas lembranças de um passado que se distancia...

Comentários

  1. Excelente texto. É preciso que a população conheça a evolução histórica do município além das consequências socioambientais para intervir naquilo que é mais urgente que é promover a construção de uma cidade com qualidade de vida para os cidadãos feirenses.

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  2. Excelente texto. É preciso que a população conheça a evolução histórica do município além das consequências socioambientais para intervir naquilo que é mais urgente que é promover a construção de uma cidade com qualidade de vida para os cidadãos feirenses.

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