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Placas de inauguração contam parte da História do MAP

  Aprendi que a História pode ser contada sob diversas perspectivas. Uma delas, particularmente, desperta minha atenção. É a da Administração Pública. Mais ainda: a dos prédios públicos – sejam eles quais forem – espalhados por aí, Brasil afora. As placas de inauguração, de reinauguração, comemorativas – enfim, todas elas – ajudam a entender os vaivéns dos governos e do próprio País. Sempre que as vejo, me aproximo, leio-as, conectando-me com fragmentos da História, – oficial, vá lá – mas ricos em detalhes para quem busca visualizar em perspectiva. Na manhã do sábado passado caíram chuvas intermitentes sobre a Feira de Santana. Circulando pelo centro da cidade, resolvi esperar a garoa se dispersar no Mercado de Arte Popular, o MAP. Muita gente fazia o mesmo. Lá havia os cheiros habituais – da maniçoba e do sarapatel, dos livros e cordeis, do couro das sandálias e apetrechos sertanejos – mas o que me chamou a atenção, naquele dia, foram quatro placas. Três delas solenes, bem antigas.
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O asfalto que sepulta lembranças

  A descoberta não faz muito tempo, talvez duas semanas: asfaltaram a rua Deputado Rui Santos, ali no Sobradinho. Ia à afamada feirinha do bairro numa manhã de domingo quando, ao dobrar na rua da Liberdade, me deparei com a reluzente camada de asfalto. Coisa recente, intui, constatando a transformação, irreversível. Fiquei até com a impressão de que o cheiro de betume ainda dançava no ar. Não, não defendo ruas esburacadas, nem renego o festejado progresso que o asfalto, supostamente, denota. Mas é que a Deputado Rui Santos – só fui descobrir o nome correto da rua há pouco, numa consulta à internet – faz parte do meu passado. Não recordo dela na poeira, como deve ter sido no começo. Recordo-a calçada – sempre as mesmas pedras ásperas do calçamento feirense, azuladas e róseas – abrigando uma infinidade de disputas de “golzinho” na minha infância e adolescência. “Golzinho” era diversão simples, sem sofisticação: pedras ou sandálias demarcavam o gol estreito, medido pelos pés; uma surra

Propaganda eleitoral é diversão garantida

  Fiquei impressionado com a propaganda eleitoral na televisão. Mais: fiquei entusiasmado. Estamos salvos: há muita gente bem intencionada, altamente qualificada, mobilizada para tornar a Bahia e o Brasil melhores. Quem quiser constatar é só acompanhar as transmissões, no começo da tarde e à noite. Nem vou mencionar as campanhas majoritárias: os candidatos a deputado – estaduais e federais – são suficientes para eletrificar as esperanças de um futuro melhor. A turma está tão entusiasmada que não se limita ao trivial eleitoral – lutar para melhorar a saúde, a educação, gerar emprego e renda – e avança prometendo assumir funções que, no papel, cabem ao Executivo. Tudo bem: num País em que o presidente da República terceirizou o orçamento para o “Centrão” e vive tentando usurpar atribuições do Judiciário, não há problema nenhum. Há os insatisfeitos – sempre há os insatisfeitos – que reclamam dos chavões, dos clichês, das frases feitas que ornamentam as breves falas dos candidatos. Não v

A dissimulada simpatia pelas milícias

  -Sou contra esse negócio de direitos humanos! Nem sei se o senhor é a favor, pode até ser, mas acho que vagabundo tem que ter medo de polícia! Quando é preso, tem que apanhar, cair no cacete, como era antigamente! Eles matam pai de família e esse pessoal dos direitos humanos não vai na casa, mas quando é vagabundo, aparecem logo lá, fazem o maior escarcéu! O sujeito pilotava um veículo batido, enferrujado, decrépito. Trajava camiseta falsificada de time de futebol, bermuda, sandálias. Motorista de aplicativo. Deplorava na sociedade essas inclinações humanitárias que, segundo ele, estimulam a vagabundagem, a marginalidade. O silêncio do interlocutor o inquietava. Pelo retrovisor encorajou – exigiu – opinião. Ouviu: -Concordo! O País está entregue aos larápios. São eles que mandam. Veja aí essa coisa de PCC, de milícia... Aí, com o comentário, o homem abrandou: a exaltação que o punha agitado se desfez abruptamente. A palavra proibida – milícia – o desestabilizou. Ficou sem jeito, t

Pesquisas alimentam folclore eleitoral baiano

  Pesquisa eleitoral sempre causou polêmica no Brasil. Na Bahia, então, desde a eleição de Jaques Wagner (PT) em 2006, no primeiro turno, – as pesquisas indicavam reeleição do governador Paulo Souto no primeiro turno – o assunto acirra os ânimos, provoca acalorados debates. Não falta quem só atribua credibilidade às pesquisas que favorecem seus candidatos favoritos, outros – mais radicais – desdenham de quaisquer levantamentos e por aí vai. Na sexta-feira (26), o Ipec – instituto que reúne antigos executivos do Ibope – divulgou um levantamento sobre as eleições baianas. Nele, o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto (UB), crava 56% das intenções de voto; Jerônimo Rodrigues (PT), ex-secretário da Educação e candidato governista, alcança 13%; Já João Roma (PL) – ex-ministro de Jair Bolsonaro, o “mito” -, está com 7%. Curioso, fui consultar pesquisas anteriores, do Ibope, de 2006 e 2014, quando o petê prevaleceu depois de largar em desvantagem, conforme levantamentos da época. Em 2014, por e

Lucifé

  O episódio foi há quase duas décadas. Aconteceu em 2005, por aí, lá em Itaberaba. Mulherengo e beberrão, o cidadão resolveu regenerar-se, abandonar a vida desregrada que rendia falação na vizinhança, numa cidade miúda – não recordo qual - na Chapada Diamantina. À época, os primeiros fios de cabelos brancos começavam a despontar nas têmporas, precisava criar juízo. Passou, então, a frequentar uma igreja nas redondezas de casa. Certa manhã, chegou no trabalho, comentando: -O pastor falou sobre Lúcifer. Disse que significa anjo de luz... A imagem fascinara-o. Lúcifer não apenas era anjo, mas de luz, reluzia, irradiava divindade. Entusiasmou-se, tocou adiante aquele conhecimento - que agadanhara na leitura de versículos bíblicos - nas rodas de conversa na empresa. Um dos colegas – motorista – também se encantou com a expressão, que vinha a calhar: mortificava-o a escolha de uma expressão para o lameirão do caminhão que conduzia em extensas jornadas Bahia afora. -Vou mandar pintar Lúc

Campanha começa com eleitor arredio, assustado

  Quando era criança, costumava acompanhar familiares – meu pai, minhas irmãs – até as seções eleitorais em que votavam. Para menino, aquilo era uma diversão e tanto: a agitação dos cabos eleitorais com suas camisetas, bandeiras e adesivos, o incessante ir-e-vir dos eleitores, as filas extensas à frente das salas, os santinhos voando, acumulando-se nas sarjetas, os carros com suas buzinas estridentes e seus jingles , os candidatos no corpo-a-corpo tentando arrebatar eleitores no calor do sufrágio, as incessantes transmissões radiofônicas, com novidades o tempo todo. Os maiores locais de votação costumavam concentrar os cabos eleitorais, a militância. Bandeiras, adesivos, camisetas – estas últimas, depois, foram proibidas pela Justiça Eleitoral – produziam rica diversidade de cores, de números, de ideias. Embora cada um corresse atrás de suas convicções recrutando eleitor, hostilidade não era a regra, havia até uma simpática convivência, temperada pelo bom humor dos baianos. Até hoje