Parece que, nos próximos meses, pretende-se revogar esse
negócio de aposentadoria, de direito a ócio remunerado no fim da vida. É o que
se deduz com base nas propostas que estão sendo urdidas lá no Planalto Central,
em Brasília, pelo controverso presidente Michel Temer e sua equipe. Pelo que
noticia a imprensa, aposentadoria, para os mais jovens, só a partir dos 65
anos; mas com valor integral só com inacreditáveis 50 anos de contribuição.
Alguém na temerária Brasília deve ter descoberto que
aposentadoria é coisa de comunista, de subversivo, de malandro, de vagabundo,
de quem não gosta de trabalhar. Daí resolveram revogar esse inadmissível
privilégio com um expediente sorrateiro: estabelecem-se pisos altíssimos
demais, para que apenas uns poucos privilegiados consigam alcançá-lo. Mas, evidentemente,
cobra-se de todo mundo, é claro.
Quando criança, na década de 1980, espantava-me andar pela
Feira de Santana e me deparar com incontáveis idosos desvalidos, pedindo esmola,
sem um mínimo de dignidade no fim da vida. Caso a temerária reforma da
Previdência prospere, voltaremos àquela época em um par de décadas, no máximo.
Pior: com muito mais idosos perambulando pelas ruas.
Na era da informalidade desenfreada, do renitente subemprego,
do desemprego crônico e da terceirização voraz, exigir idade mínima de 65 anos,
com pelo menos 25 anos de contribuição e outros 50 anos para ter acesso à
aposentadoria integral – normalmente, com valores irrisórios – é tramar um
genocídio contra os futuros idosos brasileiros. Sobretudo contra a base da
pirâmide social, os brasileiros mais pobres, que se dedicam à labuta mais
pesada.
Quem não atender essas exigências, provavelmente, vai vegetar
à míngua, à espera de improváveis benefícios sociais, triste mendicante no fim
da vida. Apesar da contumaz letargia coletiva que caracteriza a conduta
política dos brasileiros, é improvável que a reforma traiçoeira seja aprovada
sem reações. Mesmo com o nocivo Congresso Nacional que vota conforme o que se
regateia no balcão.
O Brasil atravessa uma quadra insana, de
conservadorismo extremado. Nela, visa-se revogar os mais elementares direitos
dos trabalhadores, empunhando-se os rótulos da “modernização” e da
“flexibilização”. Por enquanto, esse discurso reverbera sem o contraditório,
prevalecendo a versão governista. Pois bem: caso quem trabalha não acorde, lá
adiante, quando essas regras draconianas começarem a produzir efeitos, poderá
ser tarde demais.
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